terça-feira, 22 de julho de 2025

Tentativa #22 - Afastada

 Não é a distância que mede o afastamento.”

Antoine de Saint-Exupéry

Como sou uma pessoa que pensa demasiado nas coisas (um dos grandes motivos pelos quais a criatura anda sempre a ouvir música, para aliviar os pensamentos), dei por mim a pensar numa caraterística da minha pessoa que irrita muito outras tantas e que fico às vezes com pena de ter, mas que por agora só com grande esforço consigo contrariar.

Como não sabia o que chamar a esta coisa, fui pesquisar…Comecei por pesquisar por “desapego emocional”, mas percebi que não é bem isso, o desapego emocional é já um nível ou dois acima do mal de que eu sofro.

Bem, na verdade, o desapego emocional pode ser utilizado de forma saudável, quando nos permite “desvincular de vínculos, expectativas ou sentimentos que já não servem ao seu bem-estar. Diferente de “não se importar”, o desapego emocional saudável permite manter relações e compromissos de forma leve, sem se deixar dominar por emoções destrutivas, como ansiedade, culpa ou medo.” (portanto, não é isto…). E quando ultrapassa este nível de salubridade, pode transformar-se em “indiferença – uma desconexão que nos impede de sentir empatia ou de criar vínculos significativos.” (também não chega aqui). (www.saudelab.com)

Depois pesquisei sobre desconexão…Mas a desconexão também é algo de muito pesado em relação àquilo que sinto que me acontece. A desconexão emocional é “A desconexão emocional é um tipo específico de desconexão onde o indivíduo tem dificuldade em acessar ou expressar suas próprias emoções. Isso pode resultar em uma sensação de apatia ou indiferença, mesmo em situações que normalmente evocariam uma resposta emocional significativa. Pessoas que experimentam desconexão emocional podem ter dificuldade em reconhecer e nomear suas próprias emoções, o que pode levar a problemas de comunicação e relacionamentos interpessoais. Esse tipo de desconexão é frequentemente observado em pessoas que sofreram traumas ou abusos, e pode ser uma resposta de autoproteção para evitar a dor emocional.” (www.joicematos.com).

Pronto, fiquei a saber que também não é desconexão emocional, fiquei também a saber que não sei que nome hei de dar a isto…Mas pronto, vou explicar, porque sim, porque me apetece falar sobre isto e pronto, cá vai.

Portanto, o que me acontece é que, volta e meia, por mais que goste da pessoa e que sinta que não me farto e que adore falar e estar com a pessoa e que seja muito importante para mim, se não estiver fisicamente com ela, acabo por me afastar de todo. Tipo, não mando mensagem, não me lembro, não consigo sentir saudade, consigo estar bem sem saber da pessoa, até que chega um dia e me lembro “Ah, não falo com ela há algum tempo”, vou ver e às vezes já se passaram meses ou até anos.

Não tenho explicação científica para a coisa, mas se calhar isto até é mesmo da idade...Uma pessoa com o passar dos anos não perde só altura e ganha pelos estranhos em sítios onde não é suposto, também acontecem outras coisas estranhas neste corpicho lindo que nos deram e na cabeça então, nem se fala. Por dentro e por fora. Por fora já se sabe que uma pessoa passa de humanos a uvas passas aí por volta dos 70 anos ou um bocadinho antes se deres má vida ao teu euzinho (ou boa, depende da perspetiva). Mas na mente e na consciência (ou inconsciência) de nós próprios, de forma voluntária ou não, vamos mudando.

Sempre defendi aquela máxima de que o núcleo da pessoa nunca muda (a não ser que a pessoa tenha passado por algum evento super marcante ou uma mudança radical de vida e depende da idade em que isso acontece), mas o resto, os acessórios, vão mudando mais ou menos e vão influenciando mais ou menos o nosso núcleo, fazendo-o sobressair mais ou menos, fazendo evoluir positiva ou negativamente conforme o caso.

No meu caso penso que esta questão do afastamento, ou desprendimento temporário, como queiram chamar parece-me a mim que poderá ser um mecanismo de defesa porque (como tantas outras pessoas) já tive que "abandonar" pessoas algumas vezes por vários motivos e essa merda mói um bocadito, o espírito e a mente, e demora a passar, pelo que é melhor fazer assim um desvio. É que quando temos que nos afastar de pessoas ou quando pessoas se têm que afastar de nós, sobretudo quando a coisa é forçada, fica a saudade e a nostalgia, que são sentimentos que até gosto de ter, como já disse em Tentativas anteriores, mas é q.b., que essas malandras aleijam.

Se calhar é por causa do meu dia-a-dia, de cabeça enchida e vontade extrema de dormir (sendo este último sempre o meu objetivo final do dia durante o dia todo assim que acordo) que bloqueia o resto e os dias acabam por passar e eu sem passar cavaco àqueles de quem gosto...Quem sabe é isto e mais coisas baralhadas neste cérebro magnífico que possuo... Não sei...

Poderá ser a minha bateria social que está viciada e há momentos em que tão rápido quero muito estar com as pessoas, como digo "ah, pronto, já chega, está na hora de ir para o meu cantinho, de preferência em casa ou numa ilha paradisíaca" (só tem sido em casa, mas nunca é tarde...).

O que sei é que esta questão traz consigo aspetos muito negativos, nomeadamente, pensarem que me estou bem a borrifar para as pessoas.

Tipo eu estou lá se precisarem de mim, é só chamar que no que puder ajudar eu vou, ou mesmo para um café, mas, principalmente para quem não me conhece pode pensar que sou daquelas que só faz conversa de circunstância e depois não quer saber e já nem se lembra da pessoa.

Quem me conhece sabe que não é assim, que é uma caraterística parva minha, que eu gostava de não ter porque, embora com a maior parte das pessoas de quem gosto mesmo, por mais tempo que passe sem falarmos, quando voltamos a falar é como se nos tivéssemos visto ontem. Com esta coisa toda acabei por perder contacto com muita gente, por exemplo, com pessoal do básico/secundário não tenho já qualquer contacto, da faculdade fiquei com um contacto permanente e pronto, é isto. Amigos não tenho muitos à pala desta minha coisinha, mas sei que os que tenho estão aí para mim e eu para eles quando é preciso (e às vezes quando não é também). Se calhar afinal até é bom, é um filtro natural que aqui a bonita tem.

Eu antes de ser assim tinha o mal oposto, na verdade. Apegava-me muito às pessoas, e muitas vezes não era correspondido, era de mim que se afastavam. Portanto, é com grande probabilidade que seja este o grande motivo pelo qual acabo por ser eu a fazer isso agora. Faço isto de forma não consciente, ou pelo menos não totalmente de forma consciente, para não fazer dói-dói de novo. É que, como devem saber, uma pessoa quando gosta muito de algo ou alguém e perde esse algo ou alguém fica aleijadinho na cabeça e no heart, e ninguém gosta muito disso (quer dizer, há quem goste, mas isso já é conversa para outro episódio).

Para aqueles a quem já fiz, ou faço isso, peço desculpa, não é por não gostar de vocês, é mesmo o chip que está avariado. Estou aqui para vocês, podem e devem mandar mensagem (ligar só em caso urgente, porque a moça aqui para telefonemas custa-lhe um pouco), podemos falar até mais não e combinar um cafezinho ou outro. Mesmo. Gosto muito de vocês, não se chateiem comigo por ter problemas na cabeça, podemos partilhar os problemas um dos outros, não que vá solucionar, mas ao menos pensamos “olha, não sou a única a bater mal”.

A ver se continuando o estudo e a escrita esta minha caraterística social se altera e evolui para melhor e encontro aqui um equilíbrio entre ser a abandonadora e a abandonada, nem que tenha que começar a pôr lembretes no telemóvel tipo “deixa de ser antissocial, manda mensagem aos amiguinhos para não pensarem que te passaste de vez ou que fugiste para outro continente”. Pronto, vou tentar, mais um desafio, mais um esforço a ver se melhoro.

Até lá deixo já aqui um beijinho e pronto, espero que vos tenha agradado esta Tentativa, depois de três semanas de abandono (veem? É mais forte do que eu, mas já voltei, estou aqui ainda).

Da Vossa Criatura-Mais-Velha!

domingo, 29 de junho de 2025

Tentativa #21 - Pensamentos intrusivos

 

"Pensar é fácil. Agir é difícil. Agir conforme o que pensamos, isso ainda o é mais."


Johann Goethe 

Olá, olá, amiguinhos desesperados!

Aproveitando desde já a citação acima, por vezes dou graças por ser mesmo assim, por não agirmos conforme pensamos...É que às vezes os pensamentos que surgem nesta cabecinha são tão exóticos que é melhor deixá-los somente lá na cabecinha mesmo.

Antes de vos falar dos meus pensamentos intrusivos e da super capacidade de conter quase todos eles, digo-vos que estive a pesquisar um pouco sobre o assunto e não sabia que a coisa podia ficar tão séria (isto, provavelmente, porque os meus pensamentos intrusivos são-no porque surgem do nada, mas normalmente são só parvos e gerados pelo tédio ou pela vontade de explorar outras fontes de humor - por vezes negro, mas não deixa de ser humor).

Bem, dizem que "As intrusões são pensamentos, imagens ou impulsos indesejados que interrompem o
fluxo natural da consciência e podem interferir ou perturbar o comportamento em curso. Estas intrusões são experimentadas frequentemente pela maioria das pessoas. A interferência que causam é maioritariamente não significativa e podem geralmente ser facilmente descartadas. No entanto, se o pensamento traz significação pessoal – ou seja, se o individuo interpreta como sendo um pensamento pessoalmente inaceitável ou repugnante – este pode torna-se perturbador e ter uma maior probabilidade de voltar, tornando as tentativas de o controlar ou bloquear mais difíceis (Rachman. 2014)".

Estes pensamentos surgem sobretudo em pessoas ansiosas e com elevados níveis de stress (portanto, encontramos o motivo pelo qual eu os tenho tão frequentemente), podendo agravar-se e tornar-se uma Perturbação Obsessivo Compulsiva, o que assusta um pouco, mas que por agora me parece estar controlado.

Os meus pensamentos intrusivos normalmente giram à volta de coisas que possam chatear pessoas, não é para magoar nem nada (bem, talvez alguns possam magiar um pouquinho), são mesmo só para chatear e para me rir um pouco das reações dos que assistam ao dia em que eu perda o tino e ande para aí a dar vida a estes pensamentos.

Um dos pensamentos intrusivos que mais tenho é em relação àqueles condutores e condutoras que começar a querer pisar os calos, sabem? Que têm bué pressa para ultrapassar e mesmo eu estando dentro do limite de velocidade e mesmo havendo traço contínuo nos próximos 5km eles ficam aí a cheirar a gasolina queimada do meu carro. Para esses queridos o pensamento intrusivo é aquele clássico "E se eu travasse a fundo aqui e agora? Eu nem preciso assim tanto do carro, vou de transportes, olha...". Claro que o pensamento ficasse por isso mesmo, por pensamento, mas que dá vontade de dar um cheirinho ao travão nesses momentos, lá isso dá.

Outro pensamento intrusivo acontece-me muito em supermercados...Fico sempre com vontade de apertar as frutas (sem segundos sentidos, é mesmo a fruta de comer, apetece-me ir lá esborrachá-la) e também me apetece sempre espetar um dedo naqueles bolos todos direitinhos e bonitos, ou então dar-lhe assim com a mão cheia em cima. Nunca fiz, pelo menos de propósito, mas não prometo que não venha a acontecer um dia...Portanto, se virem algo assim no vosso supermercado mais próximo já sabem quem foi.

Outro muito giro é "E se eu seguisse a direito nesta rotunda? A estrada até continua para frente e tudo". por acaso há uma rotunda muito boa para isso em Corroios, ao pé das piscinas, para quem conhece, digam-me lá se não apetece mesmo.

Mais um, só para ver quantos cromos conseguimos trocar, é no meio do nada, num sítio assim silencioso, gritar a plenos pulmões assim uma daquelas asneiras boas do Norte, sabem? Sabem, eu sei que sabem. Assim no meio de um museu ou no meio de uma peça de teatro ou de um tribunal, sei lá, largar um belo "F***-**!", assim com maiúsculas, deve ser muito fixe. Ainda não tive coragem mas provavelmente acontecerá na reforma quando já não deva nada a ninguém.

Outro, dar um toquezinho naquelas cenas de eletrocutar mosquitos, só assim a ver se chamusca ou só aleija um pedacinho...Enfim...vá-se lá entender.

Uno más: sabem quando vêm os empregados de mesa com a bandeja carregadinha? "E se eu agora mandasse uma chapada na bandeja de baixo para cima?" ou então, chegar à secretária de algum colega e espalhar tudo, tipo como quem baralha o dominó. Devia de ser bonito, eu realmente tenho muitas maneiras de arranjar inimigos, um dia que me canse do mundo e vire ermita, antes vou fazer alguma destas.

No trânsito, muitas vezes pensei "E se eu agora deixar aqui o carro e for a pé?" Tipo deixar o carro e ir, alguém há de o trazer, para a minha casa não deve ser, mas também não o devem deixar lá muito tempo. Isso e ainda no trânsito, ficar a olhar para o condutor do carro do lado para fazer tipo o jogo do sério, ou então logo com um sorriso parvo a acenar, só para perturbar a pessoa. Este último numa segunda-feira logo de manhã deve ser um mimo.

O marido também partilhou uns destes pensamentos dele comigo, também são bons estes (sim, também sofre deste mal, coitado), espero que também fiquem só no pensamento e que nunca experimente, mas se comigo nunca se sabe, com ele é pior ainda. Um pensamento é "E se eu acelerasse ao máximo e fosse pela rampa deste camião mesmo à minha frente?". Olha, era dois em um, aventura e poupança de combustível porque depois ia à boleia, não sabemos bem para onde mas ia de boleia que é sempre bom. Outro é, num lugar cheio de gente mandar assim uma pedra ao ar, a ver a quem lhe calha o prémio e quais as reações (calma, mais uma vez, estamos num lugar seguro, só a falar de coisas que não passam de pensamentos, tenham calma).

Pronto, e esta a nossa vida. Até tenho outros pensamentos desta espécie, mas são mais "fortes" e não vou colocar aqui, que nunca se sabe...Mas também me iriam fazer rir, mesmo que desde a prisão ou do hospício.

Olha, por acaso estou aqui a pensar e devia haver o dia dos pensamentos intrusivos. Todos os anos as pessoas podiam escolher um destes seus pensamentos e podiam pô-lo em prática sem consequências (faz lembrar um certo filme, não acham?), mas com limites, não podíamos aleijar muito o próximo...Havia de ser um fartote. Vou propor aos altos cargos a ver se aceitam...

Bem, esta tentativa hoje foi mais curtinha e mais tipo cenas com as quais lido no dia-a-dia e que deixo por aqui, mas foi de coração porque foi e para vos fazer rir e pensar nos vossos pensamentos intrusivos, e partilharem se quiserem e foi um tema sugerido pela maninha, portanto, aqui fica e espero que gostem e que tenham pelo menos esboçado um sorriso. 

Até para a semana. 

Da vossa Criatura-Mais-Velha!

domingo, 22 de junho de 2025

Tentativa #20 - Pais e filhos

“Criar filhos é a coisa mais fácil do mundo quando se opina, mas a mais difícil de se fazer”

Matt Walsh

Eu considero que tive e tenho uma ótima relação com os meus pais, mesmo na adolescência, mesmo com algumas perdas de paciência e arrependimentos de palavras e de ações que tanto de uma parte como da outra existam.

Os meus pais não me deram muita liberdade para andar por aí a vadiar, se calhar por isso hoje em dia sou mais caseirinha e não tenho paciência para grandes avarias (e acho que o meu fígado lhes estará eternamente grato, que pelo menos até aos 18 anos esteve praticamente alcohol free). Em troca, deram-me muita atenção e lições de vida que ainda hoje em dia me servem de base e que fizeram com que não fizesse tantas asneiras e que fizesse umas quantas de forma um bocadinho mais consciente.

Lembro-me de risadas todos os dias com os meus pais, e com a minha irmã, lembro-me de conversas íntimas com a minha mãe e de conversas profundas e filosóficas com o meu pai (que normalmente tinham lugar tarde e a más horas, e que tinham como som ambiente a minha mãe a implorar para irmos para a cama e para pararmos de uma vez com o barulho, bons tempos…) e lembro-me de uma coisa que todos os meus amigos viam como uma aberração: contava TUDO aos meus pais (e ainda hoje conto). Mas quando digo tudo era tudo, tipo tudo. E contava normalmente primeiro à minha mãe que dizia logo a célebre frase "agora vais ter que contar tu ao pai", o que usualmente acontecia depois de ter contado que tinha feito alguma porcaria. Era uma agonia, admitir o erro, admitir a asneira, ser responsável por ela e assumir o castigo que eventualmente surgisse (às vezes não surgia, porque, normalmente havia sempre uma segunda chance e eu não era parva o suficiente para não a aproveitar…resumindo, havia asneiras, mas normalmente não as repetia), mas lá ia eu contar ao meu pai, que só de olhar para o meu ar já sabia que vinha “bomba”.  

Penso que isto tudo me fez ser sempre um ser muito consciente das merdas que ia fazendo e de admitir logo que as tinha feito e assumir as consequências. Ainda hoje sou assim. Faço a asneira, apercebo-me da asneira, vou correr pedir desculpas, por vezes sou desculpada, outra vezes a asneira é grande demais e não tem desculpa, mas faço de tudo para a não repetir seja qual for o resultado.

Não consigo ser Chica-Esperta, graças aos meus pais, porque não consigo fazer cenas pela calada. Tem partes boas - sou muito lindinha e honesta - mas tem partes más - às vezes dava-me jeito não ser tão honesta mas não consigo, até porque quando tento faço uma cara muito pouco subtil, tipo uma mistura de olhinhos de carneiro mal morto com ar de quem está a tentar ignorar alguém na rua mas em que acaba por dar de caras.

É bom, sim, objetivamente, é bom ser-se assim, mas na vida adulta, sobretudo, dava jeito não o ser, às vezes, só às vezes…

Isto é na vida de Criatura-Mais-Velha como filha. Fui uma filhinha que deu poucas chatices, ou então uma filha de pais com memória curta, porque é o que os meus pais transmitem, que não dei muito trabalho (só era chata, mas isso, enfim, nada a fazer).

Agora na vida de Criatura-Mais-Velha como mãe...Ui! Isso é que é lindo de se ver...

Dou por mim muitas vezes a pensar "se calhar não era má ideia ler livros sobre como educar crianças e seguir influenciadores que defendem a teoria da parentalidade positiva e aparentemente a aplicam".

Muitas vezes consigo parar e respirar fundo antes de explodir, e não vou negar, por vezes fico orgulhosa da minha postura perante o caos que volta e meia se instala por diversos motivos (a título de exemplo, porque a minha paciência está mais parca do que o sentido que tem o julgamento dos Anjos contra a Joana Marques, porque estou de TPM, porque são quatro pessoas do sexo feminino a lidar umas com as outras, porque estou de TPM, porque estamos cansadas e com sono, porque há saudades da mãe biológica, porque há saudades de estar sossegada em silêncio, porque naquele dia não se gosta da comida de que sempre se gostou e até se pediu para repetir o prato, porque não as deixo ajudar, porque lhes peço para ajudar...Enfim, podia estar aqui uma tarde inteira a teclar que não terminava de dar exemplos dos gatilhos que levam a que a pouca paciência e diplomacia existente de repente desapareçam mais rápido do que camarão com 80% de promoção).

Quando tive a minha filha eu pensei: "Epa, isto se calhar até nem vai ser a coisa mais difícil, treinei com a minha irmã, a minha mãe diz que eu tenho muita "psicologia para lidar com crianças", eu vou conseguir ser uma mãe fixe e descontraída, vou praticar parentalidade positiva, porque não é suposto gritar com os miúdos e porque nós é que somos os adultos e eles são crianças e é normal quererem testar limites e ver até onde podem ir e como podem ter as coisas que querem..." Toda uma mão cheia de pensamentos lindos e maravilhosos. Uma série de sonhos e de expectativas que simplesmente não aconteceram! Ahahah quem diria! Eu não sou perfeita? Nah, impossível, se eu faço tudo pelos miúdos, se eu os ouço e quero ajudá-los.

É, muito giro. Mas nesses pensamentos lindos cheios de arco-íris e borboletas e unicórnios em que pensava que criar crianças era peanuts, esqueci-me de pequenos pormenores como os que passo a listar:

  • Sou humana, e uma humana com parca paciência;
  • As pessoas mudam, e, felizmente mudei coisas para melhor, mas, infelizmente, sei que mudei outras para pior (e quem lida comigo no dia-a-dia é que atura estas coisas, até um dia se fartarem, vamos fazer figas para que seja num futuro muito longínquo, porque gosto muito das pessoas que me aturam no dia-a-dia);
  • As crianças precisam de ser crianças e não peluches fofos que não fazem nada de mal;
  • Que há dias em que nem sequer nos apetece comer a nossa comida favorita, nem fazer o que mais gostamos, quanto muito estar a lidar com o caos e com as responsabilidades todas ligadas a tratar de crianças;
  • Que este último fator se aplica a crianças, que, embora não comprem nem façam a sua comida, têm dias em que não lhes apetece simplesmente comer o que têm à frente no prato, sendo esta uma coisa que parece simples, mas difícil de lidar (se deixas que não comam estás a deseducar, se forças estás a fazer algo que não gostarias que te fizessem…enfim…mais um dilema no meio de tantos);
  • As pessoas, mesmo as pessoas pequeninas, não têm empatia com todas as demais pessoas, e haverá momentos em que só nos apetece mandar-nos mutuamente para certos sítios;
  • As crianças têm gostos diferentes dos nossos e pensam por si (embora precisem da nossa orientação para poder estruturar os pensamentos e as escolhas da melhor forma, só assim para poderem ir sobrevivendo, evitando pôr os dedos na tomada e facas nos olhos ou assim);
  • O que resulta num dia no outro pode não resultar e temos que apagar tudo e criar uma nova solução para a mesma situação (esta parte para quem gosta de escape rooms do demo é muito bom, aguça o engenho e a arte de usar o cérebro);
  • Há dias em que só nos apetece estar no nosso cantinho (aplicável a crianças e adultos) e nem sempre nos apetece fazer a nossa rotina ao ritmo dos outros, o que pode ocasionar birras (aplicável a crianças e adultos).

Com a idade que tenho já tenho amigas e amigos com filhos. E, claro está, falamos destas questões, já lhes expus até à exaustão as minhas opiniões e medos em relação a criar pessoas pequeninas, e já me cruzei com vários entendimentos, uns mais rígidos e outros mais liberais em relação a este tema...

Tenho amigos que efetivamente engoliram todos os livros sobre como criar crianças sem exaltações e gritarias, e dentro deste grupo tenho alguns que conseguem (ou dizem que conseguem, que não estou lá para ver, graças a Deus, porque já me basta o meu caos, agradecida) aplicar efetivamente o que leram e que qualquer um consegue e que é só uma questão de esforço e de hábito; e depois tenho outros amigos que admitem que leram mas que não conseguem aplicar, e que até já queimaram os livros e fazem simplesmente o que lhes dá na gana, sem querer saber da opinião dos outros.

Existem outros que nem sabem bem o que é ter filhos porque feliz ou infelizmente têm uma rede de suporte tão ampla e constante que o ter filhos é quase um hobbie (um hobbie muito querido, mas que não deixa de ser hobbie porque só o fazem nos tempos livres).

Por fim, há outros (dos quais penso fazer parte) que tentam ir fazendo o melhor possível, um pouco com os ensinamentos dos pais, um pouco com o que leram, a corrigir certas situações com as quais não concordavam na sua própria educação, e que gritam, e que dão mimos, e que se sacrificam pelos filhos, mas que tentam manter o seu espaço para ser eles próprios crianças e pessoas normais e para poder namorar e dizer à pessoa que está ao lado o quando o amam, mesmo que às vezes na correria do dia-a-dia, o cansaço e os pequenos traumas do passado e do presente os atormentem. Estes pais que tentam não prestar demasiada atenção a tudo o que se tem a dizer quanto a este tema para não dar em maluquinhos, mas que, no final do dia, acabam a sentir-se mal, incompetentes como pais, tristes e preocupados de estar a fazer mal aos filhos sem querer.

E isto porquê? E quem segue este entendimento, por favor não me levem a mal, mas é a minha opinião...A culpa é daqueles que passam a imagem da perfeição (tal como acontece nas redes sociais em relação ao físico e ao estilo de vida e à felicidade e alegria constantes, aqueles aos quais já desejei coisas menos boas ligadas com Legos e assim...), há pessoal por aí apregoando que os pais só são bons se pensarem nos filhos como Deuses que não se podem enervar, nem frustrar, nem ouvir gritos, nem sofrer consequências daquilo que andam a fazer, que não eles são crianças e que não nos estão a desafiar, que eles simplesmente não se sabem fazer entender, porque eles próprios não se entendem…

Concordo em parte, por exemplo, concordo com facto de os miúdos serem só miúdos ainda com muito para aprender e muita coisa com que se frustrar e com que nos frustrar a nós, e que devemos ter paciência nesta parte, porque às vezes nem nós sabemos que caraças se passa connosco e já levamos mais anos nisto, quanto mais uma criança que mal está a aprender a escrever e a ler e a ter algumas responsabilidades na escola, e a conhecer o seu corpo e quem tudo é da sua cor e do seu sabor favoritos.

Mas por outro acho que tem que existir regras e que as crianças têm que se frustrar e estar entediadas, sim, senão vamos ter um mundo ainda mais caótico e auto e hétero destrutivo do que já temos! Temos que saber dizer não e a ouvi-lo também (mesmo que doa um e outro). Eu sei que ninguém ou quase ninguém gosta de regras, porque todos, mesmo os pequeninos gostam de liberdade e as regras vêm tirar parte dessa liberdade, mas também nos ajudam a respeitar os outros…

Enfim, olhem, aquilo que eu sei é que continuo a dar em louca de vez em quando, e a pôr os outros loucos também, mas no meio desta loucura toda, só espero que aqueles que ando a tentar criar sejam gajos porreiros, que respeitem minimamente os outros, que saibam que as coisas (boas e más) não caem do céu e que são resultado do que fazemos, que temos que arcar com as consequências dos nossos atos e que, acima de tudo, mesmo, mesmo, para não pirarmos de vez, temos que tentar ver sempre o lado positivo das coisas e ter sentido de humor mesmo que estejamos a chorar por dentro e por fora, porque o humor cura tudo (ou pelo menos ajuda a que não machuque tanto…).

Fui!

Da Vossa Criatura-Mais-Velha.

segunda-feira, 16 de junho de 2025

Tentativa #19 – Pico de Energia.

 

Minha alma está cansada da minha vida.

Fernando Pessoa

 

Olá, lindinhos, sim, “Olá” a uma segunda-feira e não a um domingo, e já vão perceber porquê.

Então, inspirada fiquei para esta tentativa no dia 10 de junho de 2025 (feriado no nosso lindo Portugal, que se coisa mai’ boa há em Portugal são os feriados), quando dei por mim a assistir e a ser alvo direto de um evento raro em minha pessoa. Sim, tive um raríssimo “Pico de Energia”.

Nem queria acreditar que o meu corpo e a minha mente eram tão teimosos ao ponto de pensar “Ah, é feriado, que giro…Vamos descansar como uma pessoa normal faz ao feriado? Claro de não, vamos começar a fazer coisas feitas loucas porque, pronto, porque sim…” Fiquei com raiva e frustrada comigo própria por não estar em sintonia com o que era suposto fazer naquele dia, ou seja, por não fazer algo que quero sempre fazer, muito, que é descansar. Mas depois pensei, bom, evento tão raro tem que ser aproveitado, e assim foi.

Arrumei e limpei a casa toda, tratei da roupa, das miúdas, de mim, li, fiz exercício, cozinhei, preparei almoço e lanches para o dia seguinte, ainda li mais um pouco e pronto, decidi que sim senhora, já eram horas de descansar, quando eram já 23h00. Pareceu-me boa ideia.

Mas o que é que acontece? Aqui esta alminha esquece-se que o seu estado normal varia entre cansaço e cansaço extremo e que, como é óbvio, tinha esgotado toda a energia num dia só, o que significava com isso que estaria (e estou) os dias que se seguissem, no modo “cansaço extremo, por favor, só quero hibernar em modo surdo, cego e mudo. Obrigada, a gerência”.

Como é óbvio não posso hibernar, porque, embora por vezes possa ser confundida com uma ursa (e até já me chamaram esse nome carinhoso), certo é que biologicamente não o sou (até mais ver), e, portanto, não posso usufruir dessa vantagem…

O que me fez pensar: de onde caraças vem este cansaço que parece que não me larga há mais de 15 anos?

Sim, não percebo…Durma ou não durma, trabalhe ou esteja de férias, tenha pessoas a fazer as tarefas comigo ou não, a resposta à pergunta “Então, como estás?” é sempre ou quase sempre “Bem, cansada só” (“só”).

Houve uma altura em que este estado era tão crítico que chegava a adormecer à mesa, a jantar, tipo de garfo na mão…

Agora consigo só adormecer a ver filmes, a ler e com conversas chatas. Já é uma evolução.

Mas por acaso às vezes preocupo-me, é que andar sempre cansada não dá lá muito jeito no dia-a-dia em que tens que fazer cenas, tipo existir e trabalhar e assim…

É que quando estou pior desta minha vida de cansaço, não me apetece fazer nada de nada, tipo nada….Só sinto saudades da cama, penso na cama, penso nos meus olhinhos a fechar e a encostar a cabecinha na almofada que está na cama e até fico com arrepios na espinha…É tão bom dormir. É tipo comer ou dormir? Dormir a comer, seria a minha resposta…

Num apontamento um bocadinho mais sério, que também é preciso, às vezes fico preocupada porque já estou a fazer tudo ou quase tudo o que dizem que se tem que fazer para não nos sentirmos tão cansados e nada funciona.

Coisas tais como, comer de forma saudável, fazer exercício físico pelo menos 3 vezes por semana, ler, diminuir tempo de ecrã antes de ir para a cama, tentar manter o espaço arrumado, dormir a uma temperatura agradável, contar carneiros, respirar conscientemente, pensar em nada…enfim, tudo. Normalmente, o último tópico indicado é que me lixa, que é “dormir bem” (quem diria…) é esse que muitas vezes não consigo cumprir.

Eu tento, juro que tento, mas não consigo de forma alguma no meu dia-a-dia dormir as “pelo menos 8 horas diárias recomendadas”, há noites em que não consigo dormir nada bem, ou são as melgas (os insetos ou as outras que tenho em casa), ou é o cão da vizinha (que o que tem de fofinho tem de alarme contra tudo o que existe à noite, até o ar…) ou outra coisa qualquer a acontecer ou não.

Então voltamos ao mesmo resultado: cansaço.

E com o cansaço vêm coisas muito giras tipo: um mau humor do demo, mais fome (e não propriamente por coisas saudáveis), menos paciência, mais vezes a ouvir a célebre pergunta “Estás bem? Estás com mau aspeto”, mais vontade de consumir álcool (para ver se dá o sono), vontade nula de fazer coisas, esquecimentos (muitos, das mais variadas categorias, tipo desde não saber onde pus o comando da TV até me esquecer da mochila das miúdas em casa – bem, antes isto do que levar as mochilas e deixar as miúdas, mas nunca se sabe…), dores de cabeça, olhos a arder e inchados, vontade extrema de hibernar (ou estivar ou como queiram chamar), começo a falar em espanhol contra a minha vontade, fico contrariada a fazer tudo (tipo trabalhar, tratar da casa, estar com pessoas, ser eu, existir…), dores no corpo, já falei da falta de paciência?

É uma panóplia de coisas boas e variadas que acontecem devido ao cansaço.

Há cansaços de vários tipos: físico, mental, emocional, social e existencial (deve haver outros, mas estes parecem-me ser os essenciais).

Agora vamos jogar ao jogo “qual destes cansaços é que a Criatura-Mais-Velha não tem?” Acertaram! Nenhum, porque tem todos! Ahahah

O meu favorito é o cansaço existencial, que acho que resume tudo e pronto.

No que toca ao cansaço existencial, diz-nos a Joaquim Chaves Saúde o seguinte: “Este tipo de cansaço é mais profundo e está ligado a uma sensação de vazio ou desalinhamento com os objetivos de vida. Surge quando a pessoa se sente presa num ciclo de tarefas sem um propósito claro ou quando questiona a razão das coisas. Não basta dormir ou relaxar para superar o cansaço existencial; exige reflexão e mudança de direção.”

Estou a tentar refletir e mudar de direção, mas o cansaço não me deixa energia para tal, muito menos para a parte de mudar de direção…Esta pescadinha de rabo na boca é muito boa, é. Dá para ter horas e horas de entretenimento mental, ah sim, porque depois, quando estou assim os pensamentos acontecem, o cérebro é só pensamentos meio que aleatórios a acontecer, e o pior é quando exteriorizo, porque obrigo a quem me atura a seguir este ciclo com lógica zero e meio zombie hiperativo que vai acontecendo.

Juro que eu já coloquei em causa se não seria bipolar ou coisa parecida (isto, sem querer menosprezar ou gozar com quem o é efetivamente e está medicado, porque é um assunto sério).

Tipo hoje, acordo de um mau humor de cão, porque o alarme quando toca significa que tenho que me levantar para pôr o dia a começar, tenho que preparar as miúdas, a mim (física e mentalmente, sendo esta última parte a mais difícil), tenho que alimentar os bichinhos lá de casa (o gato e a cadelinha), passear a rainha da casa (a cadelinha)…Chego ao escritório, continuo com sono, mas já estou em modo dizer piadas, chatear pessoas e fingir muito bem que trabalho.

Este seria considerado, por mim, um dia de bipolaridade emocional. Sendo que há outra variante, que é acordar a pensar que existir é o melhor do mundo, mas terminar o dia a tentar não agredir ninguém e a ignorar de forma imperativa os meus pensamentos intrusivos. Há outros em que a mente é unânime, acordo de mau humor e de mau humor continuo pelo dia afora, por vezes, continuando este episódio nos dias seguintes…Já raramente há unanimidade em acordar bem-disposta e assim continuar até à noite (normalmente, só se avista este fenómeno em época de férias, em que me deixam descansar).

Ah! Há outra coisa gira quando estou cansada a um nível superior do normal…Procrastino forte…O que significa o quê? Que acumulam as coisas que há para fazer…O que significa o quê? Que vou continuar cansada porque acumulei mais coisas para fazer às coisas para fazer do dia seguinte e em algum momento terão de ser feitas…Muito giro, muito fixe.

E depois há outra coisa, não sou só eu que ando assim. Quase tudo à minha volta anda assim…

Mas isto acontecia também no antigamente? É que me parece que não. Não me lembro dos meus avós e pais a queixarem-se deste cansaço estúpido…Era porque ainda não tinham inventado o cansaço? Era porque havia, mas o pessoal de antigamente é que era, e não se queixava, engolia e pronto? Era porque não sabiam que se podiam queixar, que isso até pode ser considerado hobbie? Não sei…

Mas em relação ao cansaço geral atual tenho várias teorias que quero partilhar:

1. Puseram qualquer coisa no café para nos enganarem, tipo “bebe, bebe que te tira o cansaço e o sono”, só que não! O que tem lá é uma bostazinha qualquer para nos dar mais sono e cansaço e vontade de virar múmia, tipo saliva da mosca tsé-tsé.

2. Encolheram as horas noturnas. O relógio anda mais depressa à noite e pensamos que dormimos 6 horas mas só passaram 20 minutos.

3. Aquelas pessoas que parece que têm energia infinita sugam a energia das outras pessoas todas durante a noite porque fizeram um pacto com um ser do além… (pessoas irritantes, cheias de energia…pfff).

Estou indecisa por qual das teorias me hei de decidir…Mas deve ser uma destas de certeza.

Entretanto, queria ver se finalmente encontrava o caminho para a energia, para ter menos cansaço, ou pelo menos para pensar menos na cama com tanto desejo e ânsias…É agoniante sair de casa para trabalhar e estar a contar as horas para voltar para a cama fazer uma soneca…Se alguém estava assim como eu estou e deixou de estar sem consumir substâncias menos legais, peço o seu auxílio, só quero deixar de ser um poço de fadiga.

Concluindo, estou cansada de estar cansada, cansada ao ponto de ter decidido conscientemente ontem não escrever a Tentativa e deixar para hoje porque não aguentava mais…Sei, poderia ter feito antes, só que não deu, olhem, pronto, hoje estou aqui a aproveitar a hora de almoço para deixar este meu desespero real e contemporâneo, ontem não deu. Vá beijinhos e bom descanso!

Da Vossa cansada de estar cansada Criatura-Mais-Velha!

domingo, 8 de junho de 2025

Tentativa #18 - Inspirações

"Por vezes surpreendo-me com um medo espantado das minhas inspirações, 
dos meus pensamentos, ao dar-me conta de quão pouco 
o que há em mim me pertence (ou é eu próprio)."

Fernando Pessoa

Olá, olá!

Hoje venho tarde e a más horas. Eu sei que estavam desesperados para ler os meus desesperos, mas mais vale tarde do que nunca e o que é bom faz-se esperar, não é o que dizem? Vou-me esforçar, então, para que a espera valha a pena.

Então esta semana estive a pensar numa coisa muito antagónica: como pode o ser humano enraivecer e inspirar tanto o próprio ser humano?

Este pensamento surge de dias complicados para mim (que às vezes sofro com pouco e fervo com uma gota de água e que não era assim, mas isso era quando era uma Criatura-Não-Tão-Velha, e já passou há muito). Surge de dias em que assisti e estive envolvida em episódios em que surgiram atitudes que me irritaram até aos ovários e que envolvem vitimização extrema, falta de humildade e tentativa de retaliação (e de lixar - para não dizer f**** - os outros) sem sentido nem motivo aparente.

Irrita-me profundamente episódios como estes em que sem querer damos poder a uma única pessoa para destruir o bom ambiente e algo que tem pernas para andar e ser um projeto interessante (claro que me acontece com frequência, porque os projetos interessantes olham para mim e fogem a sete pés, ou alguém os assusta e pronto, vão-se embora), porque não podemos simplesmente dizer o que nos vem na alma (a nós e a todos os que assistem a estes episódios). Pena que não posso falar tão abertamente como queria, porque se pudesse colocaria aqui o que me apeteceu responder mas tive o autocontrolo e a sabedoria de não dizer- Opto, antes, por continuar sabia e controlada, porque sou uma pessoa mudada e muito mais matura, mas na mesma com os meus pensamentos e ideias sobre pessoas do género absurdas e na mesma a querer mandar essas pessoas a certos sítios menos agradáveis fazer coisas menos agradáveis (sim, vou continuar contida para não ferir suscetibilidades nem ofender ninguém, que isto já se sabe como anda, já vos informei deste facto na Tentativa passada, de nada, como diria o Maui).

Isto é gente que parece que não sabe o seu lugar e o seu papel nos sítios, ou pior, que se aproveita disso e tira só as vantagens e empurra para os outros as desvantagens. Pessoas que depois de fazer uma pequena bosta de mamute e depois de quase dar cabo de tudo aparecem sorridentes como se nada fosse...O que vale é que, de vez em quando, vem quem de direito pôr as mãos na massa e as coisas no seu devido lugar, e  agradeço sempre a essas almas porque ainda dão esperança de que o mundo se vá compondo...Eles afinal andEm por aí...

Engraçado é que se os dias de que vos falo me deram raivinhas interiores e vontade de me sentar a fazer terapia com as personagens envolvidas, certo é que também fizeram com que o meu otimismo, que parece às vezes viver num canto fechado e escuro do meu cérebro, decidisse vir dizer um "Oi!".

Verdade, isto muito inspirado também pelas coisinhas que ando a ler, porque como já vos disse, o cérebro dá para treinar e alimentar e ele responde conforme o que o treinas a fazer e o que lhe dás de comida. No caso, tento alimentar e treinar mais o lado esquerdo do córtex pré-frontal, porque é este lado fofo que nos dá uma visão mais positiva de todo o caos que nos rodeia...Sim, o meu lado direito do córtex pré-frontal já está super treinado, está bombadão mesmo (deve ter tomado creatina e tudo, porque é forte o gajo), por isso não precisa de mais, é deixá-lo descansar agora.

Bem, e o que aconteceu, então? Perguntam vocês e eu respondo-vos. Decidi pensar assim "Então, vá, quem me desmotiva já sei quem e que está sempre pronto para a ação, então e quem me inspira para continuar nesta vida linda a conseguir aguentar as ganas que me dá às vezes de ser menos sábia e ponderada, quem é?"

Felizmente, a resposta não foi quem é, mas sim quem são? Sim, adivinharam: alerta pirosa, alerta pirosa (melhor que o alerta CMTV)!

Então vou começar aqui a minha lista fantástica, de pessoas fantásticas que me inspiram e que não me deixam desistir e que fazem de mim a coisa fantástica que vós conheceis:

1.º - Os meus papás. Se há pessoas que me inspiram a ver o lado bom da vida, mesmo que a vida seja uma filha da mãe e que nos esteja sempre a pôr limão com sal nos olhos, são este belo casal de pombinhos. Sei que também têm momentos de desespero em que já não sabem mais com que armas lutar, mas nunca desistem, são tipo a Padeira de Aljubarrota, lutam nem que seja a mandar com papos secos aos problemas. Sempre nos inspiraram, a mim e a minha irmã, não só a lutar, como a lutar sempre de cabeça erguida, sem pisar nem humilhar ninguém e sempre com o bom humor de muleta para não cairmos (só vamos coxeando). 

2.º - A minha irmã e o meu cunhado. Bem estes dois são os putos geração Z menos geração Z e mais lutadores, criativos, enérgicos, responsáveis (em certos pontos, noutros não me vou pronunciar) e que não largam o osso até não comerem até ao tutano, que conheço. Já me inspiraram inúmeras vezes, sobretudo quando me começo a queixar de excesso de trabalho e coisas do género, porque normalmente vêm estes dois putos-maravilha, mostrar-me que mais vale calar a boca, armar-me em forte e seguir em frente até ter o que quero. Vêm fazer-me lembrar que ainda é preciso sangue na guelra para pôr esta m**** toda a mexer!

3.º - O meu maridinho. Este gajo é só um génio. Quando não sabe resolver logo, fica parado a pensar na situação, em silêncio, entra na sua caixinha a ver um vídeo explicativo do Youtube, fecha a caixinha, sai dela passado cinco minutos, vem carregar num botão e soluciona o problema. Isto não só me inspira como me mete invejinha, porque eu sou a pessoa que tem o problema, desespera, berra, ralha e depois é que lhe surge uma inspiração qualquer, cala-se, vai resolver, volta para pedir desculpa e continua caminho. É isso e inspira-me também a arriscar, seguir em frente, confiar em que se queremos alguma coisa é ir no caminho até ela e havemos de conseguir, se não é de uma maneira é doutra, mas conseguimos. Mais acrescentar que este é um ser autodidata, não só tecnicamente como na vida em geral...

4.º - A minha filha. Esta coisa de pouco menos de metro e meio, tem sido a minha força motora desde que nasceu. Desde que esta pestanuda nasceu eu soube que nunca mais poderia desistir, que teria de ser um exemplo para ela, que a tinha que pôr sempre em primeiro lugar, não para me pôr a mim de último, mas para ela conseguisse ver em primeira fila todas as possibilidades que esta vida nos dá e que temos que lutar e que ela conseguirá tudo a que se propuser. Este meu ser é de extrema inteligência, criatividade, empatia, generosidade e, como já referi em Tentativas anteriores, de um sentido de humor de qualidade igual ou superior a muito humorista profissional que por aí passeia! Por isso me inspira diariamente a tentar ser melhor, por ela e por mim.

5.º - A madrinha da minha filha. Esta mulher está sempre de mangas arregaçadas para o que der e vier! Pouco ou nada se queixa dos encontrões que a vida lhe dá, e quando se queixa é porque já tem uma solução a caminho e é só para sacudir o pó e seguir em frente. Sempre com vontade de continuar e alcançar objetivos, e com uma energia, organização, sinceridade e preocupação pelos outros de meter raivinhas das boas, e isto tudo sempre de sorriso na cara! 

6.º - A mãe do meu afilhado. Aqui não é só inspiração como agradecimento. Foi quem me tirou de um dos piores infernos em que estive, foi quem me ensinou que para todos os problemas na nossa profissão há uma solução, nem que seja chorar e pagar multa. Ensinou-me também que quando queremos muito algo só depende de nós, mas que também é importante rodearmo-nos de pessoas às direitas (não politicamente falando) e que estejam para acrescentar e não para nos tirar. E ensinou-me que mais vale uma dúvida que uma dívida, ensinamento este muito importante e valioso para quem passou anos a ter vergonha de fazer perguntas porque a iam achar burra.

7.º - Todos os humoristas que marcaram a minha infância, adolescência e vida adulta, tais como, Emílio Lovera, Roberto Gómez Bolaños (Chavo del Ocho), Rowan Atkinson (Mr. Bean), Jim Carrey, Robin Williams, Steve Carrel, Tatá Werneck, Ricardo Araújo Pereira (e demais Gatos Fedorentos), Bruno Nogueira, Carlos Vidal, Gabriela Barros, dentre tantos outros, por me inspirarem a rir e fazendo rir para que todo este lodo de vida seja menos escorregadio e nojento, e tentar mesmo em situações bem lixadas (e muitas e muitas vezes em momentos muito pouco ou nada oportunos) dar uma boa gargalhada e rir de coisas sem nexo, porque a vida não tem nexo mesmo...Só combinamos todos, mesmo sem saber, fingir que tem. 

8.º - Todos os filhos das suas mãezinhas que me disseram, que insinuaram ou que faziam questão de me esfregar na cara que eu não era boa, que era medíocre, que não sabia o que estava a fazer, que era má profissional e até má pessoa, essas "pessoas" que só sabem humilhar e subir na vida a fazer montinho com todas as pessoas que vão pisando no caminho. Estes foram a minha grande inspiração não só para não gastar energia desnecessariamente como para saber como não ser na vida e nas relações com os outros.

A todos os que referi e a outros que me possa ter esquecido, porque a memória de Criatura-Mais-Velha já parece uma uva passa do ano passado que ficou esquecida num canto da cozinha onde a vassoura não chega, o meu muito obrigado!

Aqui chegados, espero que se tenham inspirado também, que pensem em coisas boas e que ponham o vosso lado esquerdo do córtex pré-frontal cheinho e todo turbinado, como bem dizia essa grande poeta, Ana Malhoa.

Da Vossa Criatura-Mais-Velha!

domingo, 1 de junho de 2025

Tentativa #17 – Meus queridos anos 90

Oops!...I did it again.”

– Britney Spears

 

Eu bem dizia que andava meio nostálgica, e ando, já há algum tempo…A atualidade também não está a ajudar muito a gostar mais do presente do que do passado e receia-se “um pouco” o futuro.

E por este motivo tenho pensado muito nos anos 90 e inícios de 2000, belos tempos, como dizem, e bem, eramos felizes e não sabíamos.

É verdade que também havia nessa época guerras, caos e tristeza um pouco por todo o lado.

Mas não podem negar que era tudo mais divertido e melhor (pelo menos para quem passou a sua infância/adolescência nessa altura).

Primeiro e principal, podíamos dizer o que nos apetecesse porque ainda não estava de moda o cancelamento. Tínhamos mais piada, portanto. Havia mais anedotas que beliscavam no sítio certo e outras que eram só tontas, porque, não sei se lembram, mas o objetivo de uma anedota, pasmem-se, é fazer rir (whaaat?).

Sim, verdade, verdadinha.

É verdade que também tem que haver limites e respeito pelos outros, mesmo quando estamos só a tentar ser engraçadinhos e ter alguma piada, mas hoje em dia estamos do lado oposto da barricada.

Hoje temos que pensar 1000 vezes no que vamos dizer, confirmar 1500 vezes quem está à nossa volta para ver quem tem ar de ofendido, e temos só 3 ou 4 temas possíveis para “piadas” e “conversas descontraídas”. Estamos a ficar uma autêntica seca, portanto.

Passamos de engraçadinhos deprimidos para deprimidos ofendidos, porque o ar na sala está mais frio do que devia estar e a pessoa que controla o termóstato não teve isso em conta, sei lá, nunca se sabe o que está a ofender.

Um tema atual em particular que também me arrepia o cérebro e que não tínhamos nos tempos gloriosos de que falo é a apropriação cultural. Sim, é verdade, chegamos a esse ponto em que um branco é posto quase na barra do tribunal por usar tranças e coisas desse género. O engraçado é que normalmente quem grita “Apropriação cultural! Choça com eles!”, normalmente nem sequer é da cultura alegadamente apropriada. Normalmente, quem é da cultura em causa e vê estas situações (pelo menos quem ainda quer ter amigos e viver saudavelmente em sociedade) fica até orgulhoso porque significa que a sua cultura já está a chegar a outros, que gostam dela e que a aprecia.

Enfim…desculpem lá, não quero ofender ninguém, mas há coisas que não me fazem sentido nenhum e chegam até a dar-me alguma urticária, inclusive. Não aprecio lá muito pessoas com mente quadrada e que não têm sentido de humor e isto como está vai dar numa sociedade cheia de cultura pobre e sem uma pinga de sorrisos e de gargalhadas (não vá alguém ter os dentes amarelos ou a gargalhada demasiado sonora e ainda ofende alguém, nunca se sabe, fiquem atentos).

Outra coisa que me deixa saudades são as músicas. Eu sei, seu sei, depende muito dos gostos e pronto, mas parece-me a mim que a criatividade e vontade de criar coisas novas agora pertencem só aos artistas alternativos, todos os outros parecem demasiado preocupados com o ambiente, é que passam a vida a reciclar músicas, parece tudo igual. Juro que às vezes oiço cerca de três/quatro artistas supostamente diferentes mas que confundo sempre que oiço…Parece o ataque dos clones, mas clones que orgulhosamente se consideram únicos e originais.

Estou a ser mazinha eu sei, eu até canto algumas músicas dos clones, e estou a dizer isto mas o meu gosto musical passa também por muito guilty pleasure. Quem não gosta de uma bela musiquinha da Britney Spears, da Christina Aguilera, da Shakira ou mesmo da JLo? Não respondam, que se não gostam fico ofendida.

Mas o que mais gostava de ouvir (que as acima indicadas eram para dançar, que eu era a rainha da pista de dança quando estava nos píncaros dos meus 10 anos de idade, ah pois é!) e que me faziam vibrar mesmo ouvindo só sons, porque não percebia uma palavra de inglês, era Nirvana, Bob Marley, Limp Bizkit, Linkin Park, U2 (quando eram fixes), Coldplay (quando eram fixes) e Blink-182, ah e Avril Lavigne (esta última está na fronteira, vá).

Para além da liberdade de expressão e de boa música, tenho buééésss saudades da bendita e pacífica ausência de aparelhos eletrónicos sugadores de almas, e do tempo de qualidade que tínhamos por não estar só andar com o polegar para cima e para baixo a esfregar um ecrã. Mesmo que fosse não fazer nada, mas nada mesmo, de olhar literalmente para o ar, tem mais qualidade que estar colados ao ecrã, porque nos permite pensar e não estar num estado zombie autêntico (contra mim falo, que já estou melhor, mas não sou hipócrita a esse ponto e não vivo debaixo de uma pedra, também de vez em quando esfrego o polegar no ecrã – não sejam malandros com os pensamentos, não é um trocadilho, o verbo esfregar existe e é para ser usado).

Tenho saudades de jogar polícia-ladrão, a apanhada, ao macaquinho do chinês, de jogar à bola, de estar horas e horas na piscina, de andar só por aí a apanhar flores, pedras, borboletas, folhas, de fazer desenhos no pavimento com cacos de tijolo, de dançar até doer os pés e até ficar completamente encharcada, de falar de tudo e de nada com os amigos horas e horas a fio, de rir até doer as bochechas e a barriga, de roubar manga da árvore do vizinho e comer com os amigos, de ouvir a minha mãe a chamar-me para voltar para casa só com um assobio (verdade, ganda assobio o da minha mami, ainda hoje em dia se o oiço volto logo para casa), de parar para ficar a olhar o bando de araras a pôr uma cor bonita no céu…

Agora não, agora o não fazer nada parece mal, parece só perda de tempo ou que a pessoa tem problemas sérios. Se for descanso com aquele tempinho no ecrã é bom, que está na moda, mas o estar parado a olhar para o nada e estar quieto a pensar no nada, isso sim que é proibido porque é perda de tempo e meio esquisito (e não se pode gostar de esquisitos, já se sabe).

Até a comidinha era diferente, meu Deus! Menos saudável em alguns casos? Talvez (eu tinha de lanche escolar bolos e refrigerantes, e de pequeno almoço muitas vezes tinha um palmier gigante cheio d’áçucar), mas tinha mais sabor, trazia mais alegria a quem comia e com o que transpirávamos a brincar aquilo evaporava só (no meu caso a evaporação era mais lenta, mas pronto, isso também são pormenores). A comidinha saudável também era melhor, pelo menos na minha memória nos anos 90 e 2000 tudo tinha mais sabor e mais sentido de ser vivido.

Confesso que hoje me desiludo muito com o que vejo e oiço, e com o que como também (nada mais trágico do que decidir provar algo que comias em novo, com os padrões atuais de saúde…não sabe a nada…pasmem-se que o Chocapic está classificado com “A” naquela escala alimentar que agora vêm nas embalagens de comida! “A” nessa escala = “Ainda sabe a qualquer coisa, não sejam assim”), mas sei também que é normal e que daqui a uns anos, muito provavelmente (e se tudo correr bem e não descambar mais ainda) terei saudades também desta época.

Última nostalgia: desenhos animados ao fim-de-semana a partir das 7 horas da manhã e até mais ou menos as 12 horas. Penso que não haverá criança dos anos 90 alguma que não se tenha queixado de acordar cedo todos os dias da semana mas que depois nos fins-de-semana se tenha levantado, sem despertador (!), antes das 7 da manhã para ver os desenhos favoritos. Não, não tínhamos desenhos animados 24/24, por isso os apreciávamos mais e havia sacrifícios a fazer. Hoje em dia não só temos desenhos todos os dias a toda hora, como os episódios são super repetidos. Também pudera, quem tem capacidade para criar 10 episódios novos para passar todos os dias?

E eram desdenhos tão giros (os nossos pais não achavam, claro…não sei porquê se eram plenas obras de arte). Eram os Looney Toons, os Flinstones, Scooby-doo, Rugrats, o Recreio, as Tartarugas Nijas, Ren & Stimpy, a Carrinha Mágica, Power Rangers, Animaniacs, Samurai X, Pokemon, Yu-Gi-Oh, Coragem - O Cão Cobarde…Bem, tantos, tantos desenhos, tantas e tantas horas bem passadas.

Eram horas mágicas aquelas de manhãs de fim-de-semana. Eu só fazia figas para que os meus pais não acordassem tão cedo, para poder estar na paz do Senhor só a ver os meus desenhos animados malucos e, muitos deles, sem sentido nenhum (lembro-me de um episódio em particular de Ren & Stimpy, um dos desenhos mais sem nexo que já vi na vida, em que o Ren teve que ir à procura de um pum que lhe fugiu pela cidade fora). Isto sim, eram desenhos de qualidade, não o que há agora…Vergonha de desenhos 24/24. Não, não é inveja…nada mesmo…

Ai, mas quem me dera voltar uma semaninha a essa época em que tudo era leve, livre e solto, só para respirar um pouco e aguentar mais nesta coisa que temos agora.

Bem, agora mais fora de brincadeiras, isto tudo chama-se nostalgia. E a nostalgia é boa, mas pode ser lixada e também é algo com que tive que vir aprendendo a lidar melhor, até por ser uma imigrante mais neste Portugal que espero que não vire para outro rumo…Uma imigrante que veio numa idade meio lixada para Portugal e teve que criar novos hábitos e novos tudo, portanto, sim, o olhar para trás traz um monte de saudades.

Mesmo assim, eu gosto da nostalgia, porque é meio agridoce, traz-nos o bom do passado e faz um quentinho charmoso no coração, mas também nos traz tristeza e frustração por não poder voltar física e efetivamente para esse tempo de que tanto temos saudades, para dar uns últimos abraços, para ficar a olhar mais para podermos lembra-nos de tudo ao pormenor, para poder ser o que já fomos com sonhos do que seríamos agora mais uma vez. Mas se for com controlo, até esta última parte é boa porque nos força a fazer isso nem que seja com a imaginação e já gera também conforto e não nos deixa esquecer do que fizemos e com quem estivemos, para irmos orientando quem somos para não nos perdermos.

Eu, mesmo gostando da nostalgia, tive que a controlar, porque senão puxo os pés e a cabeça para o presente e me foco no bom que ainda temos, então a nostalgia sofre metamorfose e transforma-se na minha amiga depressão e a essa quero-a bem longe no seu cantinho escuro e cheio de teias de aranha que é lá que ela está bem.

Bom, e é isto que tenho para hoje, desesperados da minha vida.

Espero que tenham gostado e que vos tenha ajudado a viajar a um tempo da vossa vida que tenham vos tenha feito sentir bem e que tenham tido tempo para reclamar dos tempos presentes qual Velho do Restelo, que toda a gente gosta de se queixar um bocadinho para desanuviar, há até quem tenha o queixanço como hobbie (euzinha, por exemplo).

Sem mais,

Da Vossa nostálgica Criatura-Mais-Velha!

domingo, 25 de maio de 2025

Tentativa #16 – A Arte de Tentar Adivinhar

“A expectativa é o maior impedimento para viver: leva-nos para o amanhã e faz com que se perca o presente.”

Sêneca

Bem, cá estamos, em mais um domingo de desabafos e de reflexões.

Desta feita, trago uma Tentativa sugerida por uma das minhas leitoras mais assíduas, sim, que já começo a ter fãs, um clube pequenino de fãs, mas não interessa, ninguém disse que um clube não podia ser só de 2 ou 3 pessoas.

Então, o tema sugerido foi: As Expectativas.

Devo confessar que ainda hesitei em explorar o tema, porque parecia-me que de alguma forma já tinha abordado o tema em parte de Tentativas anteriores.

Mas como foi sugerido por uma pessoa pela qual tenho muita estima esforcei-me em refletir sobre o tema mas sob uma perspetiva diferente.

Comecei a pensar em como é engraçado e até sarcástico e hipócrita o que se passa, e sempre se passou, na sociedade.

É que basta falar com meia dúzia de pessoas sobre a satisfação que têm em relação à sociedade do dia-a-dia, e todos ou a maior parte dirá que não está satisfeito, que não concorda, e várias das queixas coincidirão com certos pontos-chave: desigualdade entre homens e mulheres, desequilíbrio entre tempo profissional e tempo pessoal, exigências exageradas relativamente ao como estar e como ser e parecer perante os outros…São inúmeras as insatisfações.

O engraçado nisto tudo é que acreditem ou não somos nós que fazemos a sociedade. Então, se assim é como é que isto acontece? Como é que ainda estamos neste ponto em que ninguém está satisfeito, mesmo havendo pontos de desagrado em comum?

Será por falta de coragem de ir “contra a corrente” mesmo que afinal a corrente vá ao nosso favor? Será que é porque estamos a ser controlado psicologicamente pelo Governo e afinal todas as teorias da conspiração são verdade, tipo há cenas na água, os pássaros afinal são espiões e a terra é plana?

Eu sei que existem opiniões diversas e que se calhar temos todos o mesmo objetivo e discordamos nos mesmos pontos, mas para cada um as soluções passam por caminhos diferentes, e é aí que voltamos ao mesmo de sempre, percebo.

Sei também que temos que ir todos mais ou menos na mesma onda porque o homem, mesmo que às vezes não pareça (por mim falo), é um ser sociável, que precisa dos outros para sobreviver e por isso vai na onda mesmo não gostando de água nem sabendo sequer nadar.

Também temos a questão de o homem ser um bicho de hábitos, e então atuamos assim e seguimos o que “a sociedade manda” porque “sempre foi assim, sempre assim serááá” (quem apanhou esta referência ou é fã da Disney ou tem filhos em casa a ver filmes da Disney em looping, de uma forma ou outra, #tamosjuntos).  

No entanto, desta vez o que achei interessante e engraçado nestes pensamentos sobre as expectativas é que as exigências e expectativas que sentimos no nosso dia-a-dia e que tanto nos carregam o fardo são criadas não só pelos outros em relação a nós, como, ainda, por nós mesmos. Ou seja, nós criamos a nossa expectativa para nós, para os outros e o que expectamos que os outros expectem e exijam de nós.

Esta última parte é menos simpática de todas, porque é esta expectativa com tentativa de aplicação dos nossos poderes adivinhatórios que nos lixa por dentro e que se reflete por fora.

Já pensaram nisso? É que nós não sabemos o que o outro está a pensar, não perguntamos (por medo, por vergonha, porque achamos que sabemos…), mas o nosso lindo cérebro super, hiper, mega criativo começa logo a fazer grande esquema tipo daqueles dos filmes quando estão a tentar apanhar o assassino ou assim, e começamos a pensar “ah, não esta pessoa não está satisfeita com a performance porque estava à espera que eu fizesse assado e eu fiz cozido”, “ah, eu gostava de fazer assim, mas de certeza que não vai gostar, porque não tem ar de quem goste disso”, “Não é suposto fazer assim, por isso vou fazer como sempre se fez, mas acho que giro, giro era fazer uma coisa diferente para variar”.

E isto aplica-se a todas as áreas da vida, nós é que muitas vezes fazemos as coisas porque achamos que os outros todos estão com a expectativa no máximo em relação a nós e achamos que não podemos falhar, e então desdobramo-nos feitos loucos para cumprir com a expectativa, no entanto, muitas vezes a outra pessoa nem sequer pensou no assunto e na expectativa que tem em relação a nós.

Mais, muito provavelmente, e mais se forem meio despistados com essas coisas como eu sou, provavelmente não tinham mesmo pensado no assunto, o que significa que mesmo que perguntem qual é ou era a expectativa, haverá uma resposta, mas muito provavelmente, mesmo que sem querer, será uma resposta falsa, uma expectativa pensada só no momento.

Isto para dizer que, provavelmente, mesmo perguntando às outras pessoas quais são as expectativas em relação a nós poderemos ter uma resposta falsa ou mesmo irrealista, porque não foi devidamente pensada e refletida tendo em conta todos os elementos a considerar…

Claro que há situações em que sabemos que a expectativa elevada existe, e como queremos fazer as coisas bem, cumprimos com essa expectativa, mas também sei que mesmo fazendo isto, não será suficiente, porque enquanto mais nos exigem mais damos, e assim sucessivamente, o que significa que não teremos descanso nunca.

Já tentaram não fazer as coisas olhando ou pensando na expectativa dos outros em relação a nós, mas apenas tendo em conta aquilo que nos faz sentido naquele momento? É libertador, claro que não dá para fazer sempre, até porque vivemos numa coisa que se chama sociedade, como já falamos, e pronto, existem regras, mas dá para relaxar um pouco e o nosso melhor não é sempre igual, o nosso melhor é o que fazemos da melhor forma que conseguimos com os meios que temos naquele momento, portanto…vale a pena pensar nisso (outra referência para oldies).

Parece-me, tendo pensado no assunto, que a maior parte das expectativas são irreais, irrealistas e ilusórias, precisamente porque nem nós mesmos temos em conta os meios que temos e que os outros têm para as atingir…não se pode exigir a uma pessoa que encha uma piscina olímpica uma colher de cada vez numa hora, ou, - algo que ultimamente parece ser efetivamente exigido pelas perfeitas das redes sociais – que se tenha a casa sempre e em qualquer circunstância impecavelmente arrumada e limpa, sem uma única partícula de pó e sem camas por fazer, mesmo que se trabalhe a tempo inteiro e se tenha filhos e animais de estimação. Atenção, há quem consiga, claro que há sempre esses extraterrestres que conseguem tudo ao estilo MacGyver, mas no dia-a-dia do comum mortal esse tipo de pensamentos e expectativas são só sofrimento e frustração a caminho.

Olha, lembrei-me agora de uma daquelas publicações fofas de Insta ou de outra rede social qualquer que dizia tipo: “Se queres atingir a felicidade segue a regra das oito horas. Gasta 8 horas para trabalhar, 8 horas para as coisas que gostas de fazer e as restantes 8 para dormir, e terás o equilíbrio e a felicidade que tanto queres e mereces”. Quem é a pessoa que teve esta ideia e onde mora e o que faz é que gostava eu de saber, não seria para a parabenizar pela ideia fantástica, era para lhe dar com uma casca de banana na cara a ver se acorda. É que este tipo de publicações em vez de ajudar só carrega mais na frustração, ninguém normal hoje em dia consegue fazer esta distribuição de tempo, o que significa então? Que não vai poder ser equilibrado e feliz? Talvez, mas isso não se diz assim às pessoas…que falta de chá.

Portanto, em relação às expectativas sejamos meigos connosco e com os outros. Atenção, não é sermos moles e aceitar só o que vem e pronto, é ter mais consciência do que as pessoas (nós incluídos) têm material e psicologicamente à sua disposição para atingir os objetivos e expectativas criados.

Para terminar, para as expectativas irrealistas, como não temos o Dream Crusher (Esmagador de Sonhos) do filme “Viagem de Arlo” como mascote, vamos aqui dedicar-lhes uma música da Lily Allen, cujo título é “Fuck You”.

E assim me despeço. Expectando que voltem no próximo domingo a ver que mais coisas lindas tenho para dizer.

Da Vossa Criatura-Mais-Velha! 

segunda-feira, 19 de maio de 2025

Tentativa #15 – Miss Venezuela



"Seja uma pessoa que valoriza a essência, não a aparência, cultive os valores mais profundos e não caia na tentação de se tornar um "super" em um mundo de estrelas sem brilho próprio."

Roberto Shinyashiki


Olá, olá! Como vão?

Aqui a vossa Criatura-Mais-Velha decidiu que era hora de avançar para junto das camadas mais jovens e assim e decidiu criar uma conta/página/perfil de Instagram. É verdade, vão seguir que vai ser muito giro (https://www.instagram.com/criaturamaisvelha_blog/).

Ora, toda a criação da página no Insta foi uma experiência, porque, para além das voltas infindáveis que dei para perceber como funcionava agora essa rede social adorável e das horas gastas a tentar perceber o porquê do Sr. Instagram não me aceitar no seu mundo e insistir em matar a conta antes da nascença, fez-me ainda lembrar do motivo para esta vossa linda não ter redes sociais para uso pessoal e livre: impacto negativo na autoestima e bem-estar mental à séria.

Mas antes demais, vamos até às origens de todo este encanto e desencanto pela beleza humana e pela obrigação social de existência permanente de beleza e perfeição, sobretudo para o género feminino, euzinha inclusive. É que cada vez mais se fala deste tema, mas o certo é que a relação tóxica com a beleza padronizada não apareceu só agora com as redes sociais e com as demonstrações extremas de perfeição mental e física que as influencers teimam em publicar. Não, não, esta relação de amor-ódio, para mim, pelo menos, vem de muitas vidas antes desta.

No meu caso, o início de toda esta jornada começa com algo que parece inofensivo e singelo, de seu nome: Miss Venezuela.

Este evento parava por completo a Venezuela, como se de uma final Benfica-Sporting se tratasse cá em terras lusitanas.

Para mim, a Miss Venezuela também era um evento brutal até porque também nós (eu, a minha Abuelita e minha mãe) parávamos para ver quem ganhava, se era justo, se era só bonita ou se tinha alguma coisa na cabeça que desse para dizer mais do que “Olá, sou a Miss Caracas e quero muito paz no Mundo”.

Mas agora que penso e analiso a situação, é um concurso bizarro. O concurso existe para os homens verem gajas supostamente boas e para que as mulheres do clube dos comuns-mortais criticassem as bonitas por serem bonitas (e de certeza não terem uma pinga de inteligência) e as menos bonitas porque não deviam ter direito a participar num concurso de beleza daquela categoria.

Houve uma Miss Venezuela que me marcou: Alícia Machado. Era uma das favoritas desde início, esforçou-se, passou por todas as restrições e mais alguma que são normais nesse tipo de concursos, em que até o sentido de humor limitam, e lá ganhou e ficou muito feliz, tal como todos os seus fãs. Mas, passados que foram alguns meses, foi duramente criticada porque teve a ousadia de engordar. Foi capaz de desiludir um país inteiro por amor às arepas, que desgraça e que ingrata que ela foi.

Eu ao ver isso com cerca de oito anos fiquei preocupada e triste, porque efetivamente era uma miúda gorducha (perdão, eu não era gorda, era maciça e com ossos fortes, como a minha Abuelita bem dizia sempre que alguém ousava dizer que eu tinha uns quilinhos a mais, mentiras atrozes dessas pessoas invejosas) e ainda para mais tinha um exemplo de mulher linda, magrinha e perfeita em casa: a minha mãe - que ainda hoje em dia é dona de uma beleza e carisma inigualáveis (para mim, será sempre a merecedora do título Miss Venezuela).

Porque fiquei assim? Porque o que retirei do que vi nessa altura é que o que era correto e bonito e aceitável era ser o mais magra possível, e que não tinha interesse nenhum o resto, nem inteligência, nem sentido de humor, então se nem sequer a queridinha da Venezuela podia fugir aos padrões de beleza porque gostava mais de comer do que de dar entrevistas em bikini a mostrar os abs super definidos que era logo ostracizada, o que me restava a mim, não é?

Depois tínhamos outras indicações forçadas e constantes em como ser magrinha, linda, perfeitinha, adorar maquilhagem, odiar comida e ter pensamentos próprios, bem como rejeitar qualquer tipo de atividade que se aproximasse a “coisas de meninos” é que era o caminho a seguir se queríamos crescer como mulheres parideiras e de família e socialmente aceites…

Essas indicações também tinham uma máscara de inofensivo, mas que na verdade afetava e afetou o psicológico da maior parte das meninas que passaram por isso e sobretudo para aquelas que não tinham desde logo uma autoestima saudável.

Essas indicações apareciam em forma de Barbies com corpos perfeitos mas totalmente utópicos. Em especial as publicidades em que, para além de estarem sempre lindas, maravilhosas, magras, super bem maquilhadas e com penteados perfeitos, as Barbies eram capazes de tudo, de ter qualquer profissão e continuar sem olheiras, sem um cabelo fora do sítio e sempre com um sorriso perfeito…Mentiras! Ultrajes! Criação de ilusões e de expectativas irrealistas! A Mattel deveria ser processada! Estou a exagerar, claro, mas é forte o que fizeram e fazem com a cabecinha das miúdas, e mesmo dos miúdos, que não têm capacidade de filtrar e de ter espírito crítico em relação a estas coisas (que, com idade com que se brinca com essas coisas ninguém ou quase ninguém tem, de todo).

Falando em publicidades, também há outra que me atinge em todos os nervos: as publicidades de pensos higiénicos e afins em que mostram uma mulher maravilhosa a fazer trinta por uma linha, as atividades mais radicais e satisfatórias, sempre impec e sempre com cabelo estilo Pantene a acompanhar, quando bem se sabe qual é a realidade das coisas…A realidade é feia, com borbulhas, com inchaço, cólicas, cãibras e com uma vontade de ficar na cama à espera que a coisa passe e a rezar para não mandar ninguém para um certo sítio sem querer. Para os senhores que inventaram essas publicidades e que ainda se orgulham disso, espero que durmam numa cama cheia de legos lubrificados com óleo e que sintam cheiro de naftalina de forma constante e por toda a eternidade.

Outra coisa muito gira era e é a perfeição das atrizes e cantoras que se nos apresentam nesta vida como exemplos. Também elas sempre lindas e maravilhosas e as favoritas de tudo e todos até que fritam a pipoca pela pressão ser tanta e decidem entrar num cabeleireiro à-toa e rapar o cabelo todo (quem percebeu, percebeu, quem não percebeu, vão perguntar ao Sr. Google que ficam logo a saber quem foi a louca).

Isto deveria chegar-nos para perceber que a maior parte dos ídolos das crianças e jovens são “feitos à medida” para que passem a mensagem que se quer: tens que ter a vida perfeita e ser sempre feliz e estar sempre no teu melhor. Ou seja, deveria ser o suficiente ver o que a exigência pela perfeição faz às pessoas mesmo dentro da área (no género masculino também, como é óbvio, mas creio que com mais “entusiasmo” em relação ao género feminino onde as exigências estendem-se a todos os aspetos da vida), para perceber o quão mal está esta sociedade e o quanto temos que ajudar os miúdos a perceber que está bem não ser perfeito e que o importante é ter uma relação saudável connosco e com os outros e com tudo o que há à nossa volta, nomeadamente, comida, bebidas e outras substâncias, e sobretudo que é para aproveitarmos enquanto cá estamos para viver e para gostar de viver, mesmo com dias maus pelo meio, e não para sofrer com que os outros esperam de nós e que depois se tornam as nossas espectativas também mas falsamente.

Bem, na minha altura a psicologia e preocupação com o que as crianças poderiam estar a retirar dos programas e conversas que apanhavam dos adultos não tinha a importância que tem nos dias de hoje. Por isso, mesmo tendo uns pais excelentes, certo é que me deixei influenciar, e muito, por aquilo que retirava da cultura pop e das exigências da sociedade em relação ao que as meninas e mulheres deveriam ser: perfeitas em todos os aspetos e em modo permanente.

Isto reflete-se até aos dias de hoje, e, voltando ao início da conversa de hoje, foi com o Instagram que percebi que por mais adulta que seja, quando algo não está devidamente tratado e curado, pode ter as mesmas consequências do que em criança.

Eu tive Insta parcos meses durante o ano de 2021 e digo-vos uma coisa, consegui sentir-me de novo como uma criança/adolescente que via as perfeitas desta vida, a achar que essas perfeitas o eram sempre e que eu, sem-vergonha e preguiçosa, não era como elas porque tinha sido desleixada, porque elas têm sempre a vida toda cuidada e calculada e que por isso é certamente muito fácil “é só organizar o dia” e que eu simplesmente era uma baldas (olha a Patrocínio, com 4 filhos paridos e sempre a meter inveja às pessoas, e eu só com uma assim dessa forma). Achei que deveria ser mais “Instagramável”, que deveria ter sido a vida toda disciplinada, quase obcecada com a perfeição, porque o efeito de não o ser era o estado lamentável em que me encontrava.

Adivinhem…As perfeitas o são para as fotos e vídeos que postam nas redes sociais, mas não o são durante o dia-a-dia, todos os dias das suas vidas, ámen. E adivinhem…Eu sempre soube isso, mesmo quando olhava para as fotos de corpos, caras e vidas perfeitas das perfeitas desta vida. No entanto, adivinhem…Este sistema cerebral que para aqui anda estava num estado tal que mesmo sabendo, se deixou afetar e se autossabotou, destruiu mais um pouco a autoestima a ficar a olhar para as perfeitas.

Eu acho muito difícil seguir aquela máxima que muito provavelmente criaturas que passaram pelo que eu passei neste aspeto criaram: Ama-te como és, és perfeita assim! (até porque em termos de saúde e de equilíbrio acho perigosa também esta vertente…pode dar muito para o torto e continua a dar importância em demasia à perfeição e à beleza, só que já numa de aceitar o destino e aprender a gostar).

Mas certo é que, para mim foi muito libertador deixar essa rede social do demo, pelo menos ao nível pessoal, e ir percebendo que temos fases melhores e fases piores, mas o que importa é haver um equilíbrio entre expectativa e realidade, para que possamos lidar bem com nós próprios, mas sem sermos desleixados em demasia, porque isso também acaba por querer dizer que não nos importamos connosco e isso não pode ser.

Portanto, resumindo e baralhando, tenham e sigam redes sociais e tenham como exemplos as perfeitas desta vida, se assim se sentirem melhor, mas tentem sempre olhar também para o espelho, sem comparação, com orgulho e utilizar só como fonte de inspiração para poder alcançar o equilíbrio.

Sejam mas é felizes, mesmo que com formatos e feitios diferentes!

Da Vossa Miss Criatura-Mais-Velha!

 

domingo, 11 de maio de 2025

Tentativa #14 - Devil in Disguise: A Alegria

 "As nossas possibilidades de felicidade são assim limitadas desde o princípio pela nossa formação. É muito mais fácil ser infeliz."

Sigmund Freud


Como estão, meus desesperados do coração?

Eu por aqui ando bem, no meio dos meus desesperos e pensamentos desesperados diários. E no meio disso tudo, dei por mim a pensar num tema que me despertou o interesse porque, embora me pareça que se vai ouvindo cada vez mais sobre isto, ainda acho que é um tema que surpreende, porque é disruptivo daquilo que a sociedade nos tem vindo a empurrar goela abaixo.

Esse tema é a Alegria ou Positividade Tóxica.

Verdade, esta emoção tão boa e que toda a gente persegue e quer constantemente alcançar, pode ser péssima para a nossa saúde, da cabecita e do corpuxo.

E porquê perguntam vocês, como pessoas ansiosas e desesperadas que são, tal como eu.

Como é possível que uma emoção positiva (das básicas, até sendo a única considerada como emoção positiva) possa ter um efeito destrutivo e negativo?

Eu digo-vos como! Sim, que tenho lido e pensado e analisado esta questão curiosa. 

Primeiro, embora esta parte fuja um pouco daquilo que se tem vindo a considerar como sendo a alegria tóxica, um aspeto negativo da alegria é a falta de capacidade de foco e até de inteligência que por vezes sinto quando estou demasiado alegre (e não me refiro a quando tenho ajudas químicas para estar nesse estado).

Sim, é verdade, eu sinto e já constatei por meios próprios e diretos que quando estou demasiado feliz/alegre fico exponencialmente mais burra (ou menos inteligente, pronto), fico muito menos focada e só quero é estar a lourar a pevide e no bem bom.

Tudo o que sejam assuntos sérios ponho-os bem, bem longe, nesses momentos, evito falar com pessoas que me venham pôr a pensar com assuntos mais complexos, mesmo que sejam muito interessantes e que até goste e basicamente restrinjo-me a conversas em que o objetivo seja o volume de piadas e risotas por minuto que possa existir.

Fico também em modo não quero fazer nada que não seja estar a desfrutar desta sensação, o que significa que a preguiça (que até é o meu animal espiritual e tudo) venha ao de cima com toda a força, o que significa que não há exercício físico para ninguém. O que faz sentido, porque, em princípio, quando se está com a "sensação plena de felicidade/alegria" não precisamos de nada mais, portanto, o cérebro fica no bem-bom e não quer sair de lá.

Fico em modo bobo da corte, portanto.

Se gosto? Gosto, muito, se pudesse ficava nesse estado de burrice alegre o máximo de tempo possível. Se posso? Não posso, não...até porque o meu trabalho não permite e ficar nesse estado de forma constante provavelmente seria indicativo de que deveria já tratar do meu cantinho no Júlio de Matos.

Depois temos o que de há uns tempos para cá batizaram de "Alegria Tóxica", sim, nesta nova era tudo o que não gostamos e é "perigoso" batizamos de "tóxico", já esgotaram os outros adjetivos.

E o que é isso de Alegria Tóxica afinal? É o resultado de uma sociedade que nos quer a todos alegres e a ignorar os problemas e os sentimentos menos docinhos.

É aquela conversa que se encontra em qualquer página de rede social motivacional ou mesmo em slogans de instituições públicas e privadas em que encontramos frases como "Tudo vai ficar bem" (por vezes acompanhado de um arco-íris...faz-vos lembrar alguma coisa?), "Tem pensamentos positivos que tudo o que mais queres  vai-se concretizar só por isso", "Força o sorriso que o resto acontece por si" e coisinhas fofas, giras e docinhas desse género.

Também encontramos esta conversa com amigos e no seio familiar, quando estamos a desabafar as nossas angústias e sobretudo se essas angústias e desesperos se começam a prolongar um pouco mais do que o politicamente correto (que é tipo 5 minutos por mês ou assim), começam a surgir respostas para abafar isso tudo como "Vais ver que vai passar", "Tem calma que já passei por isso e resolvi, por isso tu também consegues", portanto, basicamente, "Cala-te lá que estás a estragar a vibe". 

Atenção, nem sempre estas frases cliché surgem somente para deixar de ouvir queixumes. Às vezes surgem porque do lado de lá já não têm mais meios nem ideias para nos ajudarem e resta a cartada da tentativa de consolação e de dar uma esperança mesmo que vazia de sentido. 

Eu compreendo, também faço isso, não me vou a armar em boa (porque já sou mesmo, estou a brincar, vá, vocês já leram as Tentativas anteriores...não me deixam mentir). Mas por vezes mesmo com esta boa intenção, certo é que se abafam sentimentos e emoções que a pessoa que está a falar conosco precisa de deitar cá para fora (como nos aconselhava aquela publicidade antiga da TMN - atual MEO - Meo Deus, estou mesmo a ficar uma criatura bem velha).

Sei que gera não só desconforto ouvir alguém a expor sentimentos e emoções negativos, de expor os seus problemas, de ver pessoas a chorar ou a desesperar e não saber o que fazer, como às vezes se torna mesmo chato, porque uma pessoa quer é estar descansadinha e a sentir boa vibe e não a aturar o chato a queixar-se (sou eu muitas vezes esta última personagem). Mas a diferença entre abafar a conversa e deixar a pessoas falar abertamente, sem se sentir criticada ou deslocada por não estar feliz, cabe na tal diferença entre empatia e simpatia (aconselho que vejam este vídeo para se perceber melhor esta diferença, tem só 5 minutos e é com bonequinhos e tudo - https://youtu.be/KZBTYViDPlQ?si=s0O8YMacvI6x9y8o), e que pode fazer a diferença na vida da pessoa, podendo até encontrar alguma solução verdadeira só de estar a conversar sobre o assunto, ou mesmo perceber que afinal aquela emoção negativa não tem que estar tão forte e que não é assim tão grave o que se está a passar. 

Portanto, temos a  "alegria tóxica" como a procura e imposição incessante de positivismo, que obriga, por contrapartida, a suprimir tudo o que sejam emoções negativas e as suas variantes e vizinhas (como a tristeza, a raiva, o medo e o nojo - sim, o nojo, porque com a positividade tóxica temos que gostar até do que não gostamos, que é para não quebrar a cena). 

Esta crença ou obrigação social atual leva a uma procura desesperada de algo que não existe: a felicidade permanente e eterna, sem interferências ou apagões (é quase uma caça aos gambozinos). O que, por sua vez. prejudica, e bem, a nossa rica saúde mental e física, porque nos provoca mais stress, mais ansiedade e mais depressão, não só pela repressão das emoções como a pressão de ter como única emoção válida a alegria (sempre me irritou a Alegria do filme DivertidaMente, agora já sei porquê).

Portanto, concluindo, tanto para o nosso bem, como para podermos evoluir e sermos pessoas minimamente equilibradas temos que tentar equilibrar as nossas emoções, tanto as positivas como as negativas, porque, tal como já nos ensinavam os antigos, tudo o que é demais enjoa e faz mal (até água a mais faz cirrose, portanto, agora pensem...).

Bora então ser felizes q.b. e começar a abraçar as outras amiguinhas que vão surgindo, não para as ter como gémeas siamesas mas para tirar proveito de cada uma delas em cada momento, sempre tendo como foco a nossa saúde e a dos que nos rodeiam (há alergias alimentares, penso que também poderá haver alergias emocionais, por isso, temos que ter atenção aos consumos excessivos, acho que é uma metáfora do caraças esta, fogo!). 

Espero que tenham gostado e que vos tenha feito algum sentido toda esta conversa, se quiserem dizer da vossa justiça, estejam à vontade, como sempre.

Da vossa emocional Criatura-Mais-Velha!