domingo, 27 de abril de 2025

Tentativa #12 – Supersticiosa

 Evitar superstições é outra superstição.

Francis Bacon.

Ora, cá estamos de novo, para mais uma tentativa, mas, desta feita, e como já estou farta de ativar o lado negativo do cérebro, apetece-me falar de um assunto que sempre achei engraçado porque, normalmente, por um motivo ou outro, leva as pessoas a se contradizerem, e isso é sempre giro de se ver.

Então, o tema, claro está, são as superstições.

Uma superstição é, segundo o meu grande amigo Priberam – Dicionário Online, o seguinte:

1.Sentimento de veneração religiosa fundada no temor ou ignorância e que conduz geralmente ao cumprimento de falsos deveres, a quimeras, ou a uma confiança em coisas ineficazes.

2. Opinião religiosa fundada em preconceitos ou crendices.

3. Presságio que se tira de acidentes e circunstâncias meramente fortuitas.”

No entanto, aqui o Priberamzito está a ser um tanto ou quanto “provocador”, porque põe no mesmo saco superstição e religião…ai, ai, ai, Priberam, olha os cancelamentos e cenas.

É que na verdade, entende-se que há diferenças (pelo menos em teoria e para quem quer acreditar nestas cenas todas).

Há diferenças não só entre superstição e religião, como entre a superstição e a astrologia, os rituais e as crenças. Não se pode misturar, oh malandro!

A superstição, atendendo a um conceito mais neutro, diria que é o é o que refere o Priberam no ponto 3 da definição, e, ainda, situações ou atos em que acreditamos e atitudes ou comportamentos que tomamos que podem ser considerados irracionais, baseados no entendimento de que esses atos ou comportamentos, só porque sim, e porque acreditamos nisso com força suficiente, influenciarão o nosso destino ou o acontecimento de outras ocorrências.

Já a religião, embora haja quem entenda que também não passa de ideias e comportamentos irracionais de um grupo de pessoas que pensam todas da mesma forma, tem como diferença o facto de se acreditar num poder ou ser superior ou em um conjunto de princípios e valores que fornecem um sentido e significado à vida, com práticas que visam a conexão com o sagrado e com o espiritual.

Já a astrologia, como todos bem sabem, é donde surgem as nossas verdades absolutas, porque naquele dia em específico, a todas as pessoas deste mundo, do signo Sagitário vai acontecer o que as estrelas, as cartas e/ou os búzios estão a dizer que vai acontecer. Estou a ser mazinha e hipócrita, até porque de vez em quando, sobretudo em tempos de aperto vou dar um olhinho na astrologia, nem que seja para me descansar por uns minutos em que acredito plenamente no destino puro e duro.

Na verdade, a astrologia diferencia-se das superstições porque, é tida como uma forma de nos compreendermos a nós mesmo e ao universo, consistindo num sistema simbólico que revela padrões da alma humana – pronto, isso e o horóscopo, que é o que aqui a lindinha gosta mais de ir ver de vez em quando.

Por sua vez, as crenças e os rituais são, respetivamente, comportamentos gerados pelas nossas experiências ou as do meio em que vivemos, e interações entre grupos sociais ou culturais, com certos simbolismos, normalmente associados à religião. 

Perante estas áreas de estudo, a superstição é que o que acho mais engraçado porque, normalmente, mesmo que “não se acredite”, não existe uma alminha neste lindo mundo que não cumpra com uma ou outra superstição “pelo sim, pelo não” ou porque “mal não faz e nunca se sabe”, ou se existem são unicórnios.

Mas o que achei curioso é o papel da superstição na psicologia, porque, mesmo considerando que não tem fundamento científico e que raramente faz sentido, podemos usar as superstições, consciente ou inconscientemente, como um mecanismo de redução da ansiedade e onde entregamos ao Universo e ao acaso a resolução de situações de que nos geram incerteza ou medo.

A superstição ajuda muito em momentos em que já não se sabe bem o que fazer para resolver a situação de forma lógica e racional, e então, recorre-se àqueles “truques” que a avó e a mãe sempre fizeram e que “resultaram”.

Eu sinceramente, não vivo nada em função disso, raramente penso nessas coisas porque quem me conhece bem sabe que sou uma pessoa super racional, lógica e objetiva, e então nem acredito nessas coisas.

Só de vez em quando é que só para não haver problemas ou mesmo para resolver um ou outro que queira surgir é que faço assim uma coisinha ou outra, mas nada demais.

Por exemplo, só assim para ver se o dinheiro vem tenho uma folha de louro na carteira. Mal não faz e nunca se sabe.

Às vezes se a coisa não está a correr como devia e parece que me sinto assim meio com a aura pesada, vai um banho de sal e queimo pau santo.

Não aprecio passar por baixo de escadotes, que já ouvi dizer que depois acontecem coisas que não devem.

Se se diz algo que não quero que aconteça, nunca está demais bater três vezes na madeira.

Varrer os pés é uma coisa proibida desde que me lembro, não pode, não deve, não se faz de todo.

Se uma pessoa seca as mãos à mesma toalha que eu largo logo, mas só por uma questão de respeito, claro, não é porque toda a minha vida ouvir dizer que se duas pessoas secarem as mãos à mesma toalha depois discutem uma com a outra.

Andar com um olho de boi na carteira ou na mala também não custa, não é? E assim as boas vibrações vêm com mais força, também o olho é levezinho, uma pessoa nem dá conta que o tem.

Mas só faço estas coisas, nada de superstições, porque isso não faz sentido nenhum, nem tem qualquer base ou fundamento científico. Nem sei como ainda existem superstições no mundo modernos, mas pronto, olha, é o que temos.

E vocês são supersticiosos?

PS: Já agora, e só porque me apetece partilhar o assunto, e porque pode ser que leve alguém a tentar, informo com orgulho que conclui com nota máxima o desafio dos 30 dias! Foram 30 dias sem uma gota de álcool, sem doces, sem fritos, sem comida processada e a comer muita coisinha boa, normalmente de cor verde e, ainda, 30 dias sem ver vídeos parvos e sem qualquer tipo de interesse ou objetivo, a ler mais frequentemente e a fazer exercício pelo menos 3 vezes por semana. Epa, e não é que resultou? Estou livre, leve (física – com menos 3kg -e mentalmente) e solta e recomendo vivamente! Tudo o que dizem por aí é verdade, não é mito nem superstição, tenho muito mais energia, paciência e clareza de pensamento nesta cabecinha linda! Experimentem que vão gostar (primeiro vão dizer muitas asneiras e questionar porquê se estão a fazer isso a vocês próprios, mas depois vão gostar muito!). Força com isso, por vocês e para vocês!

Beijo!

Da vossa Criatura-Mais-Velha!

segunda-feira, 21 de abril de 2025

Tentativa # 11 – O Potencial Impostor

 O combate que travam em cada indivíduo o fanático e o impostor faz com que não saibamos nunca a quem nos dirigir.”

― Emil Mihai Cioran

 

Olá, meus desesperados!

Eu sei, falhei o nosso encontro de domingo, mas juro que foi por bons motivos.

É que, para além de ser Páscoa e de ter aproveitado para passear e descansar com os meus fofos, estivemos todos a tratar de uma nova fofa que apareceu nas nossas vidas. Encontramos uma canídea abandonada, que é só a canídea mais fofa de sempre e que tem trazido muita calmaria e felicidade a nossa casa. E pronto, como sou uma pessoa que se distrai com facilidade e que acha sempre que as coisas demoram menos tempo a fazer-se do que realmente demoram, cá estamos novamente a conversar a uma segunda-feira…

Mas não vos abandono nesta cruzada que é a vida louca que levamos.

Até porque não sabem, mas ajudam-me vocês mais a mim do que eu a vocês. Não sei quem lê e quem não lê, mas só de deixar aqui os meus desabafos na esperança de ajudar alguém e que esse alguém saiba que não está sozinho neste mundo de loucos desesperados, já me deixa mais realizada e preenchida e serve mesmo como terapia low cost, mas no bom sentido da coisa. Portanto, a quem lê os meus desesperos, muito obrigada, a quem não lê, não sabem o que perdem, que é com cada pérola que para aqui deixo, que upa, upa, é melhor começarem a ler, a sério! 

Bom, mas vamos lá ao que me trouxe aqui. Na última tentativa toquei num tema pelo qual me tenho interessado porque acho mesmo que sofro dessa síndrome e pode explicar a minha vida praticamente toda.

É a bela da Síndrome do Impostor.

Explicando minimamente o que é (até porque ainda me falta muito caminho para desbravar para perceber melhor como funciona esta fofa), diz a CUF que a Síndrome do Impostor é um padrão de pensamento e “o sentimento de que não somos competentes em determinadas áreas ou situações (seja a nível pessoal ou profissional), enquanto as outras pessoas, pelo contrário, têm tudo sob controlo e sabem exatamente o que devem fazer. Quem lida com a síndrome do impostor não acredita no seu valor, mesmo quando confrontado com provas que demonstram que é capaz de executar as diferentes tarefas com sucesso.”, considerando que o que conseguem foi sorte ou que qualquer outra pessoa conseguiria fazer igual ou melhor.

Acrescenta a CUF o seguinte:

“Quem tem síndrome do impostor pode...

Acreditar que "enganou" outras pessoas levando-as a pensar que tem mais competências do que aquelas que na realidade tem;

Achar que o seu sucesso se deve a mera sorte, charme ou outras razões superficiais;

Pensar que trabalhar de forma excessiva é a única forma de atingir as expectativas;

Ter medo de ser considerado um falhado;

Sentir que não merece atenção ou afeto;

Desvalorizar as suas conquistas;

Apesar da vontade de prosperar, o medo de ser "descoberto" (por ter muita responsabilidade, cometer um erro, receio da incerteza) pode ser paralisante.”

Descobri isso e agora, e que faço check em todos os pontos anteriores, e, como sempre, só falta, assim como quem não quer a coisa, resolver o pequeno probleminha que se instalou neste cérebro fantástico e iluminado que os meus paizinhos me deram. O que por sua vez significa muita leitura, dinheiro para livros da especialidade e muitos momentos de sossego e de me aturar a mim própria para tentar perceber o que vai aqui por dentro.

Então. Tudo começa com os elogios. Não sei lidar com esses seres, que o normal das pessoas faz por merecer e ouvir. Qualquer tipo de elogio na minha cabeça serve para uma de duas coisas: para desconfiar de quem me dá o elogio ou para desistir do que estou a fazer.

Não consigo aceitar bem elogios porque não acredito neles praticamente nunca quando me são dirigidos…

Esta questãozinha com que lido, que parece tão inofensiva tem feito com que nunca tenha conseguido explorar verdadeiramente nada do que inicialmente pareço gostar e que até pareço ter jeito, nem a acreditar na minha pessoa realmente para seja o que for.

Mais. Esta questãozinha fez com que ganhasse aversão a uma palavra em particular: POTENCIAL.

É uma palavra que me acompanha praticamente desde que me lembro e que odeio de coração.

Isto porque desde tenra idade que me lembro de começar projetos, atividades e similares, de que até gosto e sinto que consigo fazer mais ou menos bem, mas depois basta vir uma alminha dizer: “Elah, tens mesmo potencial para isso, até que fazes bem, devias explorar esse teu potencial! Que lindinha e que lindinho potencial” (é ipsis verbis isto, é mesmo assim que me dizem, é, é), que assim que ouço estas palavras, começa tudo…

Começam as dúvidas. Duvido se me estão a elogiar por pena ou só para agradar. Se estou efetivamente a fazer bem. Se afinal é aquilo que quero fazer. Se serei capaz de explorar o tal potencial ou se foi só sorte em fazer bem quando a pessoa que elogiou viu naquele único momento em que estava a fazer bem.

Começa também a procrastinação incompreensível. Sei que gosto do que estou a fazer, mas quando oiço “Ai mas que potencial lindo que tens para isso”, parece que congelo, que não quero fazer mais, que é melhor deixar o projeto a meio. Afinal, se não o terminar fica o potencial por explorar mas não fica o falhanço, não fica a vergonha de afinal não conseguir fazer mais e melhor e fico o pensamento de “Ah, ela se quisesse conseguia porque tem potencial…tem é preguiça” (é mais fácil ser “preguiçosa” do que falhada).

Começam também as frustrações, as reclamações e críticas internas. Começo a pensar que não sou capaz de continuar porque não estou a fazer as coisas bem, porque como tenho “potencial” tem que sair perfeito e quando não sai perfeito é porque é melhor desistir…afinal não era potencial coisa nenhuma, e, mais uma vez, foi questão de sorte.

Portanto, e em suma, não acredito em mim e nas minhas competências mesmo que tenha provas mais do que provadas à minha frente. Isso em termos profissionais e pessoais, o que é ótimo, como muitos de vocês devem saber.

No trabalho, acho sempre que não estou ao nível que já deveria estar. Que deveria ser mais rápida, mais competente, mais desembaraçada, mais tudo e que não o sou, que sou tudo o menos…Ressoam na minha cabeça as palavras sábias de uma querida Sra. Dra. Professora da época da faculdade que me dizia “A Criatura-Mais-Velha é uma no cravo e outra na ferradura” ou, outro clássico “A Criatura-Mais-Velha vai ser uma profissional medíocre”. Assim, penso sempre que todos são melhores que eu, porque mesmo os que falham podem ter falhado naquele momento porque estavam num mau dia, ou porque tiveram azar.

No foro pessoal, mais precisamente, nas relações, acho sempre que estou a incomodar, que as pessoas não têm que me aturar e que conseguiam melhor companhia do que a minha, que só me aturam e dizem que gostam de mim para não se sentirem mal por me deixar de parte (esta partezinha é difícil de combater, mas pronto, esforço-me para ignorar os pensamentos de impostor neste campo…).

Como mãe, a sensação é que não faço as coisas como devia fazer, que devia estar sempre mais calma e serena e falar com as crianças sempre tendo em mente que são elas as crianças e que eu sou a adulta, que deveria ler mais sobre o assunto, que deveria estar mais tempo com eles, que não sou a mãe que eles mereciam ter…Enfim…Só pensamentos bons, portanto.

Nos hobbies, também é a mesma história. E algo que me deveria dar prazer e que deveria ansiar por fazer, faz-me antes sentir que, por não ser boa em nada, estou a perder tempo e que deveria estar a fazer algo mais útil.

Sim, é isso, um tormento…Um tormento que me fazem desistir das coisas antes que me venham dizer que afinal sou má no que faço, que devia desistir e seguir outra vida…Um tormento que me dá muito trabalho mental porque para sobreviver tenho que contrariar ou pelo menos ignorar muitas vezes (praticamente, de forma diária este pensamento).

Mas pronto, vou continuar a tentar perceber mais sobre este assunto e o que posso fazer para me livrar de mais esta amiguinha malandra, a ver se encontro paz e sossego e se começo a olhar para mim como os outros supostamente me veem. Acho que pelo menos já é um passo ter identificado esta questão e agora é começar a lidar melhor com isto.

A quem tenha dicas para começar a dar a volta a isto agradeço, por exemplo, com indicação de livros ou mesmo de práticas que possa fazer para ver se pelo menos fico com menos esta amiga de coração.

Da vossa Potencial Criatura-Mais-Velha! (ahah sorry, não resisti)

domingo, 13 de abril de 2025

Tentativa # 10 - Quando somos mesmo suficientes?

As pessoas não deviam viver o passado.

É o suficiente fazer o possível no presente.

 Kito Aya

Olá, olá! Hoje escrevo-vos a recuperar de um ataque furtivo das minhas amigas Ansiedade e Depressão, que já não acontecia com tanta pujança há algum tempo.

Não se preocupem, já estou melhor, graças a Deus, já sei que essas duas são amigas para a vida e que tenho é que saber lidar com elas. Já reconheço os sinais quando elas querem voltar que nem uma assombração daqueles filmes de terror que têm mais sequela que história, e então consigo lidar melhor com elas a tempo. Truques como desabafar, ler, ouvir música, fazer exercícios de respiração, passar tempo de qualidade com pessoas de quem gostas e que se preocupam contigo e basicamente lutar contra a vontade de isolamento, costuma resultar. Custa, mas costuma ter resultados minimamente satisfatórios e desta vez resultou bem.

Porquê venho com esta conversa, ainda por cima quando já falei aqui várias vezes da Ansiedade e da Depressão e não quero estar a repetir temas, porque também evitar pensamentos ruminantes é importante para conseguirmos lutar contra aquelas duas lindinhas, perguntam vocês?

Porque, com esta crisezita que tive, reparei em vários aspetos que se repetem quando estou assim. Normalmente, são pensamentos ruminantes como falei acima (pensamentos que não nos largam e parece que vão mas depois voltam vezes e vezes sem conta durante o mesmo dia, ou inclusive, durante a mesma hora), é cansaço extremo, é uma falta de paciência brutal, é o ritmo cardíaco acelerado, é dor de barriga, e…um ingrediente nesta receita fantástica que me chamou muito a atenção desta vez, agora que estou mais atenta para tentar perceber melhor o que se passa comigo e como posso combatê-lo: pensamentos derrotistas em que nos identificamos como o empecilho de tudo e de todos e que nos faz questionar a nós próprios “Somos suficientes?” “Quando somos realmente suficientes e como sabemos disso?”.

Sim, hoje o assunto é mais pesado, mas é para isso que também servem estes meus desabafos, sempre na esperança de ser uma ajuda para mim e uma ajuda para quem se consiga identificar nestes cenários, para que saibam que não estão sozinhos e que podemos sempre lutar contra aquelas duas malandras.

Então, no turbilhão de pensamentos que estava a ter nesse dia da crise de Ansiedade e em que a Depressão também deu o ar da sua graça, coloquei em causa toda a minha existência e reparei que isso acontece sempre que as duas amiguinhas em causa aparecem em cena.

Ponho em causa TODA a minha qualidade e competência como profissional, como mãe, como esposa, como amiga, como filha, como irmã, como pessoa, basicamente.

Nesses momentos, carrego em mim todo o peso do Mundo sendo eu própria a coloca-lo lá.

É difícil de explicar, mas em resumo, o sentimento que tenho é que não sou o que as pessoas acham que eu sou (acho que posso estar a sofrer com mais um amiguinho peculiar que é o “Síndrome do Impostor”, sim, eu autodiagnostico-me e tenho um quê de hipocondria, mesmo fofa que eu sou, eu sei, tenho muitos amigos e muitas características maravilhosas), que não sou o que as pessoas me dizem que acham que eu sou e todos os elogios soam-me a frases de quem quer somente agradar-me para não me magoar dalguma forma, ou para não carregar ainda mais na minha autoestima anã.

Depois disso, penso também que por mais que me esforce não vou ser boa profissional, não vou ser boa mãe, não vou ser boa esposa, não vou ser boa filha, não vou ser boa irmã. Ou pior, coloco em causa se estou a fazer todos os possíveis para ser isso tudo ou se ainda não tentei o suficiente para o ser havendo mais coisas que poderia fazer para isso. Questiono-me se sou uma preguiçosa desinteressada que por aqui anda (mesmo que à minha frente coloquem factos materiais que provam completamente o contrário!).

Entram aqui também sentimentos de frustração e de angústia extremos, sinto-me basicamente presa e a querer deixar de ser eu e ser outra pessoa qualquer (nestes momentos, até ser o Companhia, do Batatinha e Companhia, parece melhor). Nesses momentos, tudo é melhor do que ser eu, porque ser eu não é suficiente, eu não sou suficiente, nem para mim nem para os outros e sinto-me cansada de tentar tanto sê-lo sem o conseguir.

Nestes momentos quase chego ao ponto de querer pegar no carro e ir, ir e não chatear mais ninguém e não ter de SER para mais ninguém.

São pensamentos pesados, dolorosos física e mentalmente. Deixam-me esgotada. E continuo, em esforço, em contraponto, a engolir as coisas todas, a doer-me tudo, a ainda ter o pensamento de que todos os dias têm que ser bons e ótimos e que se não sentes isso és ingrata, porque tens tudo e ainda te estás a queixar. E aí volto a engolir, porque não quero ser mal-agradecida. Aí volto a responder “nada” quando me perguntam o que se passa. E voltamos à pescadinha de rabo na boca, porque respondo “nada” quando perguntam o que se passa, porque não quero maçar a pessoa, não quero incomodar, não quero que me achem chata, não quero que a pessoa chegue um dia e me ache insuficiente, mas ao não dizer, a pessoa nem tem oportunidade de pensar sequer se és suficiente ou não…

A isto, meus queridos amigos chamamos pensamentos/crenças limitadoras no seu mais alto nível! Se prémios houvesse nessa categoria, estes pensamentos e crenças nestas alturas levariam o mais importante dos prémios (tipo “E o Óscar vai para os pensamentos da Criatura-Mais-Velha na performance «Quando a Ansiedade e Depressão atacam»”).

E fica essa nuvem negra a pairar, e eu a tentar enxotá-la como quem enxota moscas no pico do Verão em dia de churrasco, e a nuvem negra fica a pairar, como se nada fosse.

Mas como a vida não para porque estamos assim.

Como, felizmente, tenho sempre pessoas de quem gosto e com quem me preocupo (mesmo que sejam poucas ou só uma, não interessa, existem), que sei que precisam de mim e eu delas, e que elas também se preocupam comigo e gostam de mim.

Como, felizmente, tenho já alguns projetos e passatempos giros para pôr em prática, e que me fazem sentir única, feliz e minimamente motivada.

Como, felizmente, existe um mundo inteiro pela frente para descobrir, mesmo que tenha que começar mais pertinho de casa e com coisas pequenas e gratuitas.

Como, felizmente, há música brutal para todos os gostos, e tenho (como todos) AQUELA música (ou aquelas músicas) que me faz flutuar, vibrar e arrepiar cada célula do corpo.

Como, felizmente, há aqueles filmes que me fazem saltar para realidades paralelas e respirar um pouco fora da minha realidade para dar uma descansadinha.

Como, felizmente, existem milhentas coisas que me fazem sentir bem, que me fazem sentir que o esforço vale a pena e que me fazem perceber que a minha vida não são aqueles pensamentos que estamos a ter e que sou eu que os crio, e que sou eu que os posso exterminar (brevemente nos cinemas “Criatura-Mais-Velha: A Exterminadora Implacável de Pensamentos Negativos”).

Como, felizmente, já começo a ter a capacidade de enfiar estes pensamentos positivos acima elencados todos na minha cabeça em simultâneo com os pensamentos negativos para que eles andem à luta, e como, felizmente, tenho uma rede de amigos e família excelente e que me dão sempre a mão, e um marido com uma paciência extrema para mim e para as minhas coisas, a nuvem negra começa a desaparecer de cena muito mais rápido do que há uns anos, e costumam ser os pensamentos positivos a ganharem a luta.

Nesta fase de descoberta que têm sido os últimos meses, de leituras, de conversas mais profundas sobre o assunto, de perceber que o que sentimos e que nos parece exclusivo, não o é, e que muitas pessoas passam pelo mesmo, tenho percebido que é mesmo, mas, mesmo, mesmo muito importante aproveitar os poucos silêncios e sossegos que temos para olhar e ouvir o que se passa cá dentro, para pensarmos, para nos questionarmos a nós próprios, para escavarmos a ver o que se passa cá dentro e porquê.

Pelo menos para mim, tem sido crucial finalmente encarar o monstro de frente, encarar todos os meus amiguinhos emocionais que para aqui andam de frente, com medo, mas de frente. Tem sido crucial parar e pensar no que estou a sentir e tentar perceber o porquê, e não continuar com a resposta típica de quem quer evitar o elefante branco na sala, não continuar com o “eu sou mesmo assim”, “desde que me conheço que sou assim”, “isto é de família, não há nada a fazer”, “eu já tentei melhorar mas não dá”.

Dói, é difícil, dá trabalho, até porque é importante indagar sobre o assunto, empapar-se de conhecimento, fazer sacrifícios, admitir que há um problema perante nós próprios e perante os outros, que não conseguimos nem temos que conseguir estar sempre bem, mas é uma dor e uma dificuldade temporárias para que o futuro não doa tanto, tantas vezes.

Amigos meus do meu coração, desta feita foi mesmo um discurso mais sério e pesado, mas acho que (e penso que a maioria de vocês concorda) às vezes é mesmo indispensável este tipo de conversas, com um tom mais sério e a olhar nos olhos dos problemas e desses nossos amiguinhos inseparáveis sem desviar o olhar, até para lhes tirar a força e para poder percebê-los melhor e saber o que fazer para os apaziguar e para nos apaziguar a nós próprios e para que deixemos de nos questionar tanta vez “Será que sou mesmo suficiente?”. 

Fui!

Da vossa Criatura-Mais-Velha!

domingo, 6 de abril de 2025

Tentativa #9 – Vícios

 

O vício é, basicamente, o amor pelo fracasso.

Elfriede Jelinek

Olá, olá! Hoje trago-vos outra pérola de coisas boas que se encontram a circular neste cérebro fantástico: os vícios.

Parece-me que não terei tanta coisa a dizer em relação a este tema como em relação aos outros, mas é um tema que me diz muito a mim e no qual penso muitas vezes, pelo que, meus caros amigos, quem queira ler e quem esteja a ler estas linhas por engano, cá vai disso.

Segundo o dicionário online Priberam, um vício é:

nome masculino

1. Defeito ou imperfeição.

2. Prática frequente de acto considerado pecaminoso.

3. Tendência para contrariar a moral estabelecida. = DEPRAVAÇÃO, LIBERTINAGEM

4. Hábito inveterado. = MANIA

5. Dependência do consumo de uma substância (ex.: vício do álcool).

6. Erro de ofício.

7. Erro habitual no uso da língua.

8. Mau hábito ou costume que as bestas adquirem. = MANHA”

Portanto, um poço de virtudes e excelência contido numa palavrinha tão pequena.

Até há bem pouco tempo considerava-me uma pessoa sem vícios. Não fumo (nem coisas legais nem ilegais, o meu estômago lindo não aguenta), não jogo (nem jogos de sorte e azar nem videojogos, nada, não tenho grande paciência nem gosto por isto), não tenho redes sociais, não nada…supostamente.

Eu, como acredito que grande parte das pessoas, viveu e/ou vive rodeada de vícios, normalmente, só reparando no dos outros.

No meu caso, sempre convivi com pessoas fumadoras (tios, amigos…), ao ponto de aos meus dezasseis anos de idade ter sido questionada quantos cigarros por dia fumava, e eu ter dito que nem nunca tinha experimentado e ter levado um sermão porque a Sra. Dra. Médica que me questionou achava que eu estava a mentir e a ocultar dos meus pais, podia ser, mas não. Era verdade. Só experimentei tabaco aos meus 28 anos, e odiei. Só que tinha pulmões de fumadora por ser fumadora passiva. Na radiografia via-se como que uma nuvem preta até mais um menos um terço dos pulmões (agora nem quero ir espreitar esses meninos para não me assustar).

Pronto, e não fumei até essa idade e ainda hoje em dia não fumo, primeiro porque o meu tio me proibiu tinha eu 5 anos, e depois ele faleceu de asma quando eu tinha mais ou menos 13 anos…O que me fez pensar na vida e achei que não valia a pena pô-la em risco, ainda por cima a gastar e a cheirar mal. Ou seja, não tinha, não tenho, nem nunca tive o vício do tabaco.

Pessoas à minha volta, e mesmo familiares, consumiam e consomem drogas, mas, como o meu cérebro já não funciona muito bem, não tenho dinheiro para gastar nessas coisas e como não me apetece ser mais zombie do que já sou, então também foi coisa que também nunca me assistiu.

Jogos, como disse, nunca tive gosto por jogar, nem paciência, então, aqui a lindinha não tem o vício do jogo.

Tudo muito bonitinho e exemplar até aqui.

Eis senão quando, a dar lições de moral a uma amiga minha, a dizer que o tabaco é só um vício, que lhe fazia muito mal, que eu nunca na vida fumei e que ela tinha que ser mais forte, que tinha que fazer por deixar de fumar, e mais uns quantos conselhos de quem claramente era uma expert no assunto, porque já tinha visto muitas pessoas a fumar (enfim, quem nunca?), tive uma epifania: “tu também tens vícios e nada saudáveis, oh coisa fofa!”

Foi então que esta alminha que para aqui anda percebeu que tinha um vício desde pequena, no qual gasta dinheiro desnecessário, que lhe afeta a saúde, que põe em risco a sua vida, que altera o seu estado emocional como uma montanha-russa, que a faz descontrolar-se, que faz com que a sua autoestima fique praticamente a zeros, que só lhe traz maior sensação de cansaço e falta de vontade e de criatividade para fazer outras coisas, que a faz autossabotar-se vezes e vezes sem conta.

Esse vício chama-se comida. Sim, sim, um vício igual ou pior que os outros dos quais estava super orgulhosa por não os ter e com sentimentos de superioridade em relação aos outros que os tinham e que eram tão fracos, meu Deus, que não conseguiam controlar esses vícios horríveis, inconcebível tal coisa.

E não é que há pessoas mais entendidas que já pensaram no assunto e que me dão razão?

Embora ainda esteja em debate no meio académico da psicologia, já começa a haver quem identifique a compulsividade com a comida como um vício, até para poder começar a ajudar melhor pessoas que sofrem com isto. Teralyn Sell, psicoterapeuta, diz que "Se não consegue parar de comer alguma coisa, come demais, fica ansioso sobre comer alguma coisa, ou não consegue abster-se de comer, sentindo-se enjoado ou com desequilíbrio de açúcar no sangue, isso é um vício".

No meu caso, a comida desde os meus 5 aninhos tem significados que podem ser muito bons: partilha, recompensa, descoberta, novas experiências. Mas, por motivos ocultos que ainda não percebi muito bem, a comida também sempre esteve ligada em grande parte ao sentimento de culpa por querer comer mais e mais, e comia às escondidas, para que ninguém visse o pecado mortal que estava a cometer, e comia o máximo que conseguia, até enjoar. E foi aqui que o gosto por comer se converteu num vício.

Hoje em dia como porque estou feliz e temos que comemorar, como porque vi algo novo que tenho que experimentar, como porque o dia foi difícil, porque o dia correu bem, porque estou com família e amigos, porque estou sozinha, porque sim, porque estou a ver TV e falta aquele petiscozinho, porque estou na esplanada e falta aquele pestiscozinho, porque tenho fome ou porque está aquela roeza que parece que falta algo grandioso na minha vida e esse algo grandioso não é nada mais nada menos do que comida (pelo menos é isso que o meu lindo cérebro decidiu guardar como verdade absoluta ou crença limitadora – sim, ando a ler umas cenas eu).

E para esclarecer, digo que como mas é comer mesmo, tipo até ficar a abarrotar e sentir-me mal comigo própria porque aquilo tudo era desnecessário e trouxe mais desvantagens do que benefícios.

Já cheguei a ter momentos em que estava menos bem e recorri à comida porque pensava que podia ajudar (recompensas imediatas, muito bom, desde que não se torne prática do dia-a-dia), mas, como não era isso que faltava na minha vida para ficar melhor, em vez de ficar melhor, ficava pior. A comida já nem sabia bem, nem dava prazer, nem recompensa nenhuma, imediata ou não, mas, como o cérebro associava a comida a uma recompensa e a algo que me deixava feliz (ativando o córtex pré-frontal esquerdo..elahhh), então recorria sempre à comida em vez de ir experimentar coisas novas, realmente boas e construtivas, para preencher o vazio ou o tédio mesmo.

E claro que a comida, em muitas ocasiões, vem acompanhada do álcool, em que eu pensava “ah, só um copinho ou dois” e acaba por continuar a beber até ficar tonta.

Comecei a odiar-me por isto. A ver-me como uma pessoa fraca e inconstante, com dietas e peso ioiô, sem energia, maldisposta, feia, gorda e sem força de vontade alguma.

E, perante isto, e considerando que sou exemplo para 4 crianças, sendo uma delas a minha fotocópia em ponto já não tão pequeno e a entrar numa fase crucial da vida (a adolescência, Deus me proteja e me guarde), decidi enveredar por outra via, concentrar-me mais noutras coisas e mostrar ao meu querido e maravilhoso cérebro que existem mais coisas que me deixam feliz para além da comida e álcool, para ver se começa a mandar novos sinais para o lado do cérebro que interessa. 

Este é um meu 13.º dia de desafio zero por 30 dias(incluindo fins-de-semana e feriados) – nada de álcool, nem de comidas gordurosas, guloseimas e a comer mais coisinhas boas, caseirinhas e a tentar pensar e fazer outras coisas que não estejam ligadas à comida. Custa para chuchu porque são muitos anos a ir só por impulso nesta área da vida, mas está a começar a dar alguns resultados, vou fazer de tudo para que vire hábito e rotina. Desejem-me sorte.

Ups, afinal, o tema desenvolveu-se, mas espero que tenha ajudado alguém, pelo menos a perceber que não está sozinho, que há solução (como nos restantes vícios), mas que sim, custa, e que temos que ir insistindo de todas as vezes que caímos para poder-nos levantar. Algum dia havemos de nos manter em pé sem voltar a cair e aí começamos a desfrutar o caminho!

Da vossa Criatura-Mais-Velha!